sexta-feira, 29 de outubro de 2004

Concurso para peritos médicos

Encontra-se aberto, pelo prazo de 15 dias, concurso documental tendo em vista a celebração de contratos de avença anuais com médicos para o exercício de funções periciais fora das áreas de actuação das delegações do Instituto Nacional de Medicina Legal (INML).
A ver aqui.

Tribunal Constitucional

Acórdão n.º 436/2004 – DR 255 SÉRIE II de 2004-10-29: Não julga inconstitucionais as normas constantes dos n.os 1 e 3 do artigo único do Decreto-Lei n.º 204/2002, de 1 de Outubro, interpretadas no sentido de possibilitarem a reposição de uma classificação como área protegida já caducada ex lege.

Acórdão n.º 495/2004 – DR 255 SÉRIE II de 2004-10-29: Não julga inconstitucional a norma do n.º 1.º da Portaria n.º 145/86, de 15 de Abril, com referência ao mapa V, na parte em que faz corresponder à categoria de "chefe de divisão" do Ministério do Trabalho e Segurança Social de Angola à data da aposentação a de "chefe de secção" do actual ordenamento de carreiras.

Legislação do dia

Lei n.º 51/2004. DR 255 SÉRIE I-A de 2004-10-29 – Assembleia da República: Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 26/2004, de 4 de Fevereiro, que, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 49/2003, de 22 de Agosto, aprova o Estatuto do Notariado

Lei n.º 52/2004. DR 255 SÉRIE I-A de 2004-10-29 – Assembleia da República: Autoriza o Governo a legislar no sentido da definição de medidas indemnizatórias pela cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia eléctrica (CAE) celebrados entre a entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Eléctrica (RNT) e as entidades titulares de licenças vinculadas de produção de energia

Decreto n.º 32/2004. DR 255 SÉRIE I-A de 2004-10-29 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Aprova a Convenção sobre Segurança Social entre a República Portuguesa e a República de Angola, assinada em Luanda em 27 de Outubro de 2003

Decreto n.º 33/2004. DR 255 SÉRIE I-A de 2004-10-29 – Ministério dos Negócios Estrangeiros: Aprova a Convenção de Roterdão Relativa ao Procedimento de Prévia Informação e Consentimento para Determinados Produtos Químicos e Pesticidas Perigosos no Comércio Internacional, assinada em 11 de Setembro de 1998 em Roterdão

Resolução do Conselho de Ministros n.º 146/2004. DR 255 SÉRIE I-B de 2004-10-29 – Presidência do Conselho de Ministros: Cria um grupo de trabalho para a reorganização dos laboratórios do Estado

Resolução do Conselho de Ministros n.º 147/2004. DR 255 SÉRIE I-B de 2004-10-29 – Presidência do Conselho de Ministros: Cria uma estrutura de missão designada «Equipa para a revisão do regime financeiro dos municípios e das freguesias» com o objectivo de proceder à revisão da Lei das Finanças Locais e um grupo de trabalho com o objectivo de desenvolver os estudos necessários tendentes à revisão da lei de finanças regionais

quinta-feira, 28 de outubro de 2004

Legislação do dia

Resolução do Conselho de Ministros n.º 144/2004. DR 254 SÉRIE I-B de 2004-10-28 – Presidência do Conselho de Ministros: Aprova o programa de acção para o desenvolvimento da vigilância electrónica no sistema penal e prorroga o mandato da estrutura de missão criada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1/2001, de 6 de Janeiro

quarta-feira, 27 de outubro de 2004

Jorge Sampaio recebe Medalha de Ouro da Ordem dos Advogados

Ver aqui.
Salienta-se esta passagem do discurso do Presidente da República:

(...) Os acontecimentos judiciários que, nos últimos dois anos, têm ocupado parte significativa do palco mediático, propiciaram, numa democracia de opinião como é a nossa, uma generalizada convicção de que a reforma da Justiça é condição essencial para que haja uma cidadania suficiente.
E com isso ficam colocados, na ordem das urgências, temas como o quadro de melhor legitimação democrática das magistraturas e da sua responsabilização, a organização do território judiciário, a estrutura e atribuições dos tribunais superiores, a formação dos agentes da Justiça, o regime de recursos, e o reforço, sobretudo na fase de inquérito, dos direitos de arguidos e de vítimas, para citar apenas alguns dos temas mais significativos.
Uma melhor legitimação democrática das magistraturas e da sua responsabilização terá de abrir caminho para que, sem perda da indispensável independência da magistratura judicial, e preservando-se a não menos indispensável autonomia do Ministério Público, se realize, finalmente, no judicial, a plena interdependência e cooperação de poderes do Estado, e se criem condições para que Governo e Assembleia da República exerçam, eficientemente, as suas funções em matéria de política de justiça, incluindo a política criminal, como exige, aliás, a Constituição da República.
Política de justiça que é indissociável de uma adequada organização do território judicial, que terá de ter em conta que as instituições judiciárias não podem entrar na lógica de aplicação de fundos ou de resposta a reivindicações autárquicas, mas são antes de mais uma exigência de eficácia, por cujos critérios deverá ser aferida uma divisão e organização territoriais, feita, tantas vezes, ao arrepio da racionalidade que lhes é própria.
Com este tema, cruza-se o dos tribunais superiores, cujos quadros e regime de funcionamento não podem estar à mercê quer de um sistema de recursos inaceitavelmente generoso, sobretudo no Supremo Tribunal de Justiça, quer de fundadas expectativas de ascensão profissional dos magistrados, cuja satisfação não tem de passar, necessariamente, pelo acesso aos tribunais superiores.
Importa, nesta linha, ter em conta o regime de avaliação do desempenho das magistraturas e de progressão nas respectivas carreiras, para que se promovam, sempre, as boas práticas e o mérito, e se encontre um estatuto de progressão profissional e remuneratória que deixe de estar ligado ao sobredimensionamento dos quadros dos tribunais superiores.
E depois a formação, onde importa revisitar a necessidade de abater egoísmos e de promover hábitos de convivência, a aconselhar o chamado tronco comum de formação das profissões forenses, de par com o aprofundamento das disciplinas relativas aos direitos fundamentais, claramente exigido pelas vicissitudes da prática judiciária dos últimos anos.
Todos estes temas evidenciam que a reforma da justiça não pode ser concebida como mera resposta às interpelações da conjuntura.
O que não impede que sejam consideradas as várias questões que, ultimamente, se têm suscitado no domínio do processo penal, onde importará reforçar, sobretudo na fase de inquérito, os direitos de arguidos e de vítimas, e libertar o sistema processual de toda uma tessitura dilatória, que contribui, decisivamente, para a sua lentidão. Tudo exuberantemente demonstrado, à vista de todos, nos processos judiciais que têm estado mais em cena.
Por eles se vê que não faltava razão ao Presidente da República quando se referia ao excesso de garantismo em determinadas áreas, excesso que convivia e convive, como, nas mesmas ocasiões, sempre sublinhei, com inaceitáveis áreas de desprotecção de vítimas e de arguidos. (...)

Boletim da OA n.º 33

... Pode ser consultado aqui.

terça-feira, 26 de outubro de 2004

2.º Congresso Mundial contra a pena de morte

Encontraram-se em Montreal, de 6 a 9 de Outubro de 2004, mais de 1000 pessoas, ONG, advogados, parlamentares, diplomatas, artistas, jornalistas e cidadãos, com a representação de 64 países. O Congresso constituiu o encontro trienal da comunidade dos abolicionistas. Entre os avanços conseguidos em Montreal situa-se designadamente a necessidade, reconhecida pelos abolicionistas, de inscrever o combate pela abolição universal numa reflexão global sobre as políticas penais (como desenvolver penas alternativas, como ter em conta os direitos das vítimas, como melhorar as condições de defesa e de detenção dos condenados à morte…). Montreal foi igualmente uma "ponte" entre os abolicionistas americanos, presentes em grande número no Congresso, e a comunidade internacional.
(Contributo de Simas Santos)

VI Colóquio Luso-Espanhol de Direito Administrativo

A Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa - Lisboa promove, nos dias 3 e 4 de Dezembro de 2004, o VI Colóquio Luso-Espanhol de Direito Administrativo, subordinado ao tema "As Concessões em Direito Público", com a coordenação dos Professores Doutores José Luís Martínez López-Muñiz e Fausto de Quadros e a presidência dos Professores Doutores José Luís Meilán Gil e Diogo Freitas do Amaral.
A entrada é gratuita, sendo necessária uma inscrição prévia, ao cuidado da Dra. Maria Cândida Andrade, por fax (21 721 41 77) ou por e-mail (para mcandrade@fd.ucp.pt).

(Pode consultar aqui o Plano das Sessões)

Nova presidente do conselho directivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, da Família e da Criança

Para o cargo de presidente do conselho directivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, da Família e da Criança foi nomeada a licenciada Ana Maria Ratel Barroso dos Reis Boto (ver aqui).

Nomeações de juízes

Despacho (extracto) n.º 21853/2004 (2.ª série). DR 252 SÉRIE II de 2004-10-26 - Conselho Superior da Magistratura

Directiva n.º 2/2004 do PGR

O crime de ameaças, previsto e punido nos termos do artigo 153.º do Código Penal, quando cometido com recurso a arma de fogo, não está incluído na competência reservada da Polícia Judiciária prevista nos artigos 4.º, alínea n), da Lei n.º 21/2000, de 10 de Agosto, e 5.º, n.º 2, alínea n), do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, podendo a competência para a investigação daquele crime ser delegada noutro órgão de polícia criminal.
(O despacho integral do Vice-Procurador-Geral da República pode ser lido aqui).

Novos docentes no Centro de Estudos Judiciários

Foram nomeados docentes no Centro de Estudos Judiciários, até 15 de Julho de 2005, a juíza auxiliar Isabel Maria Faria Canadas e o juiz conselheiro Salvador da Costa.
Ver aqui.

Legislação do dia

Decreto-Lei n.º 219/2004. DR 252 SÉRIE I-A de 2004-10-26 – Ministério da Justiça: Altera os anexos ao Decreto-Lei n.º 186-A/99, de 31 de Maio, regulamentando a Lei n.º 105/2003, de 10 de Dezembro, que efectuou a quarta alteração à Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais)

Declaração n.º 14/2004. DR 252 SÉRIE I-A de 2004-10-26 – Tribunal Constitucional: De ter sido eleito para o cargo de Presidente do Tribunal Constitucional o juiz Artur Joaquim de Faria Maurício

segunda-feira, 25 de outubro de 2004

La Veuve en Consultation


Daumier, La Veuve en Consultation
Les Gens de Justice N° 40, Oct. 1846

A BOA-HORA CÓMICA

2 de Janeiro

Subo a Rua Nova do Almada um tanto aborrecido - acabo de pagar uma enorme conta no livreiro, e de ser apresentado ao orador que eu mais detesto, depois do cornetim. O dia é pardo, nuvens no alto, o vento a erguer da rua redemoinhos dum pó corrosivo à pele; e com um milhão de diabos!, não tenho hoje visto senão raparigas barbudas nos asfaltos!
Estas picuinhas todas irritam-me: e como o Ferin não tem novidades, enfio pela espécie de saguão estreito, que a Câmara Municipal convencionou chamar o Largo da Boa-Hora. À esquerda há uma rampa bordada de vadios e mulheres públicas, nos dias de audiência: um sumidouro público no centro: carros das obras públicas a um canto: do lado direito, uma sentina pública com letreiro por cima - e enfim, como pano de fundo a todo este cenário público de caserna e de alcouce, aí temos o maravilhoso Palácio da Justiça de Lisboa! Ao subir as escadas, acho-me numa espécie de átrio com bancos de pedra em circuito, um rodapé de azulejos gastos, o pavimento de lajes, e um cheiro inquietador de ralé que me faz náuseas. Ao fundo há um portal que dá acesso a uma pequena escada de pedra, até ao claustro; no meio do átrio, duas ou três miseráveis mobílias de mansarda, que os esbirros da lei vão penhorar, e que duas outras pobres mulheres estão velando, enrodilhadas em xales, despenteadas, com sapatos de ourelo, e tendo no ar esmagado alguma coisa de horrível que leva ao Tejo, ao Casal dos Ossos ou à cadeia.
Felizmente que a polícia está de guarda ao desespero que elas esgatanham em si próprias, rasgando os xales mais, dizendo baixo a sua vida lúgubre de ménage, com maridos bêbedos, pancadas, filhos, a casa de prego, o senhorio, e quatro ou cinco libras de cão nos armazéns de provisões.
Sobre um dos bancos, um cego ouve-as chorar as suas grandes dores, e sorri-se, aconselhando meio decilitro de marufo, àquelas três princesas... o marufo ali da Tendinha, que alarga a coragem, e espairece.
Tipos esquálidos que atravessam o átrio, detêm-se olhando as cadeiras coxas, os bancos de cozinha imundos, e os baús pelados como consciências de juízes.
Num dos montões há um retrato a óleo, primitivo, representando um figurão de farda a ouro, colarinhos estrangulados por uma gravata de coleira, manto de Cristo, meia justa - o qual, todo risonho numa barba em passa-piolho, cheira uma flor com dengosidades de fruste, segundo a tradição galante dos estoiradinhos lisboetas do século passado. Mais longe, um espelho de cómoda assenta sobre um lavatório de ferro enferrujado.
Alguns fadistas entram, zangarreando a aravia rútila dos arrabaldes: e por pândega, caricaturando os casacas, vão fazer toilette diante daquele espelhinho de casebre operário, que se envergonha e treme de pudor, por ser trazido assim brutalmente à hasta pública, em meio das chufas cínicas de quem passa. Mas nesse momento uma mulher desce do claustro, ruidosa de gomas e penduricalhos escarlates. Outras a seguem, gesticulando, espaventosas, numa gralhada de codornizes fugidas da gaiola.
Um dos fadistas chega-se:
- Então? - diz ele.
A moça alumia na cara um destes júbilos bestiais de bacante esparvoada, bate as palmas, atira-lhe ao pescoço os braços esticados.
- Aqui estou livre! O juiz estava com telha. Saíram-me só três meses de multa, a tostão.
Há uma alegria que atravessa o âmbito e salpica de nódoas os três grossos montões de mobília - chalaças, risadas, berros: enquanto as outras choram silenciosamente as suas cadeiras empenhadas.
- Saíram-lhe só três meses de multa. Que dito mais flagrante! Como se na Boa-Hora a justiça não passasse duma lotaria!

Subidos oito ou dez degraus da pequena escada de pedra, aparece um pátio quadrado, com toscos arcos que restam do antigo claustro do convento. Nos dias de audiência, uma tropa de polícias, mulheritas do povo, vagabundos, simples flâneurs e informadores de jornal, acumula-se ali numa gralhada de feira; e saltam das palestras revelações de arrepiar os cabelos ou fazer rebentar às gargalhadas. O dia em que por lá passei, fora destinado ao julgamento das parteiras.
Com muito custo, atropelando massas de gente lacrimosa, que se aglomerava pelo corredor que leva à sala de audiência, lá conseguimos captar as atenções dum cavalheiro, o qual, untuoso, trocando o b pelo v e vice-versa, condescende a ouvir os nossos títulos de jornalista interessado na questão... oh!, pelo lado pitoresco simplesmente!
O cego do átrio viera subindo também, pela mão duma rapariguita esguedelhada.
- O senhor escrivão Carvalho, meu senhor?
- Não conheço, meu amigo. E vossemecê que vem fazer aqui?
- Saiba Vossa Senhoria que sou testemunha.
- Testemunha... testemunha ocular?
- Assim, assim...
Lá conseguimos entrar na sala de audiência: é uma casa oblonga, baixa de tectos, e com o pavimento imundo de escarros secos, palitos quebrados e poeira em crostas de meia polegada de espessura. Vai-lhe ao redor um rodapé de azulejos pálidos, recortando vasos de flores sobre a caliça parda das paredes. Uma grade de rampa separa o banco dos réus, do espaço reservado aos curiosos. Entre duas janelas, ao fundo, fica o púlpito do senhor juiz, um pesadão, de cabeça em pêra, sangue nos olhos, a palavra difícil, a elocução atarantada. À direita, os senhores jurados amesendam, num velho banco, a sua sagacidade bronca de hipopótamos. Um deles, grosso, obeso, glabro, com lunetas de tartaruga e olheiras papudas - cinquenta anos de honra em panos crus - é um austero mercador da Rua Augusta, cuja mulher, muito mais nova, há seis anos começa a preferir a esse marido apático de sessenta anos dois rapagões de trinta que há em casa, sob o pseudónimo adorável de caixeiros. À esquerda deste, um outro verde, a suíça dura, a mão peluda, um prognatismo feroz de australiano, parece ir criticando na sala os temperamentos através da factura do calçado, sobre que ele esparge um olho torto, minaz, desorientado, de sapateiro cúpido e facínora. E mais longe quatro têm cara de cretinos e riem vagamente um riso em navalha, escorrido dos beiços lívidos, sem comissuras, imóveis, como o das caraças de pataco.
Ainda um quinto jurado é digno de croquis. Traz um bigodão colado no beiço, o qual se despenha em catarata, até lhe ocultar o queixo e o colarinho. Sob uma tinta lúgubre, ressaem-lhe em pirâmide as maçãs do rosto, acidentadas; duas rochas-tarpeias por onde os globos dos olhos parece que vão precipitar-se: e inquieto, como um malandro feroz que a polícia espicaça, ei-lo corre com a vista a sala inteira, saca do bolso papelinhos sebentos, raspadeiras, canivetes, boquilhas, que fica a mirar, e depois embrulha, e depois guarda, para logo em seguida os tornar a exibir sobre os joelhos, esbugalhando os olhos contra as acusadas, como se aquela camaradagem de infâmia o fascinasse, e o banco onde elas se acurvam estivesse reclamando a intimidade dos fundilhos das suas calças pretas.
E este é o sinédrio de inteligências claras e consciências aplicadas, que decidirá se acaso as tecedeiras de anjos incorreram no crime, picando com estiletes de meio metro os ventres inflados das criadas ladinas, e das chics esposas que sob a aquiescência dos maridos fizeram da fecundidade uma vergonha.

Ficam da esquerda, perto do púlpito do senhor juiz, as carteirinhas destinadas ao ministério público e advogados. A sala é tão estreita, que todos estes funcionários se acotovelam uns aos outros, as rés, advogados, juiz e mais comparsaria da sala, incluindo os jornalistas, que escrevem sobre tiras de almaço as suas impressões. Toda esta família sua, e se permite exalar patchoulis de fábrica própria, a ponto de parecer que a comédia da audiência transmutou de cenário, e que o segundo acto já não decorre no templo da Justiça, senão nuns irmãos unidos que há no largo, com o seu letreiro municipal por cima da porta.
Os Russos dizem: é necessário que a cabana cheire ao dono. E na Boa-Hora assim sucede; a Justiça cheira efectivamente ao tribunal.
Depois do juiz, a fisionomia que mais fere é o delegado, os crocs do bigode recurvos em proa de saveiro, os seus anéis de oiro fosco, a sua falta de vista e a sua beca. Nunca vejo estes togados elegantes, com mãos de bispo, o ar vitorioso, e rescendendo a perfumes de White-rose e Peau-d'Espagne, que a mim mesmo não pergunte se eles irão cantar alguma ária na audiência, tão familiarmente se abraçam, no meu espírito, a noção da justiça oficial contemporânea, com o teatro, que já hoje nos dá da magistratura uma ilusão bem mais emocional.
Entre os advogado, um gordo, baixote, apesunhado, com pequeninas feições perdidas a um canto da sua enormíssima cara macilenta, tem dois olhitos que luzem no fundo duns buracos, sob uns sobrolhos hirsutos, como pedaços de hulha ao pé de dois molhos secos de carqueja. Oh, não tenham medo que haja fogo! Este advogado é de acender na caixa, e nem mesmo a dizer banalidades produz chama.
Um outro é rabulista, ele azougado, com saracoteios maganos de compadre: e os olhos gotejando resina, como duas ameixas engelhadas.
Este defende a esmo os criminosos, mostrando um álbum pelos corredores, à clientela, com as amostrinhas dos discursos, os argumentozinhos, os preços - e levando a garrafa faz-se abatimento. O seu truc é já hoje quase corriqueiro. Começa recordando ao júri as tremendas responsabilidades que impendem dum veredictum leviana ou malevolamente formulado.
Durante os interrogatórios põe-se a estudar as caras dos jurados. Júri em que haja, pelo menos, dois tolos, pertence-lhe - porque este domínio boquiabre um asno, pelo mesmo sistema por que um sapo fascina e estarrece uma doninha!
Ora, num curro de nove jurados, mesmo escolhidos a capricho, a contribuição de dois tolos é duma tal benignidade!... Lombroso disse uma vez que num grupo de seis cidadãos assembleiados para a discussão de coisa pública, quase era certo poder-se arrebanhar aí a sua dúzia e meia de patetas, sem menoscabo à toleima que cada um deles pudesse desenvolver pessoalmente.
O certo é que o meu sacripanta triunfa. Os assassinos passam-lhe todos por bêbedos, os larápios por famintos; e quanto ao adultério... histerismo!
Da sua boca loquaz, amachucada, granizam, jactitando, as frases da defesa, feitas de tudo, sentimentalidades da Biblioteca das Damas, trucs forenses, partidas, trapalhadas. E aquilo admite-se, os juízes sabem, o ministério público sorri-se, todos lhe acham graça -o alma do diabo!, o rabulista!- e indulgente, o tribunal encolhe os ombros e deixa-lhe passar a cambada de clientes, porque se não conseguiu afinal provar o roubo, ou porque não parece ter havido premeditação no assassinato.

A justiça antiga, de gládio e balança, as grandes mamelas turgentes sob o peplum, amachucou-a a Boa-Hora numa caricatura soez de alcoviteira, cúpida e manhosa, que pede cinco tostões por conta das fianças, e vai de porta em porta, e influência em influência, entregar a carta de empenho que faz vergar a consciência dos juízes, e que ao mesmo tempo espapaça a lei, como uma cataplasma de peros, no sentido cobarde do perdão.
A piedade que hoje move a simpatia do homem diante de todas as espécies de crimes, em vez de dirigir exclusivamente sobre as vítimas os seus focos de sensibilidade lírica, nevrótica, excessiva por vezes, teima em abraçar no mesmo jorro também os criminosos, que ela desculpa chamando-lhes revoltados, heróis talvez, larvados, doidos, e procurando enfim explicar, pelo bom lado, os seus impulsos cruéis de bestas-feras.
No nosso tempo, a honra é conforme. Revolta-se a gente aos vinte anos contra coisas que aos sessenta legitima sem a mais leve hesitação de consciência. Um processo caminha até deparar com o dinheiro que o asfixia na. poeira dum arquivo. Tem-se razão, conforme a argúcia do advogado que nos serve. Desmandos imperdoáveis na classe baixa são leviandades apenas na classe média, e daí para cima, qualidades!
Lassa de tudo, sob um democrático e igualitário regime que lhe tirou o carácter, a sociedade de hoje é chata e medíocre, fora dos seus acessos de febre convulsiva, e quase não tem lucidez para demarcar fronteiras entre a desonra e a probidade.
Pranzini e D. Bosco nos parecem igualmente interessantes. No fundo da nossa alma, nenhuma solidez de convicções, nenhuma crença, respeito algum. Por exemplo, a religião serve de escárnio à populaça. A lei é letra morta. Não há aristocracias de classe, impondo-se às rebeliões, como grandes portas brônzeas de fortaleza. E por outro lado, nenuma ilustração, nenhuma cultura a escorar a consciência histerizada por todos estes desmoronamentos!
Ora, desde que a ilusão daquelas sagradas coisas se perde, nós não podemos deixar de pôr a blague ao serviço dos nossos desalentos.
E é singularíssima a impressão que o Tribunal da Boa-Hora já começa a produzir em toda a gente. A princípio, ainda se percebe a distância que medeia entre os magistrados, os réus, e os oficiais de diligências. Porém, pouco a pouco, o ar enturva-se, os olhos vão perdendo a percepção contornada das imagens, baralham-se as figuras, cabriolam -e aparecem depois os réus com as togas dos juízes, os advogados sobre o banco dos réus, os juízes de oficiais de diligências... E enquanto o cego aconselha marufo à sociedade, ouve-se no átrio a voz dos contratadores oferecendo senhas de absolvição para todas as espécies de crimes, mais baratas que na casa, e a gralhada das moças que esbracejam, regougando:
- O juiz estava com telha, ó Daniel! Saíram-me só três meses de multa. Saíram-me, entenderam? Como se na Boa-Hora a justiça fosse uma questão de lotaria!

Fialho de Almeida, Pasquinadas (Jornal dum Vagabundo), 1890

Utilizou-se a edição do Círculo de Leitores, Obras Completas, IV Volume, 1992

A JUSTIÇA DE MENORES NO BRASIL

O Dr. Siro Darlan, Juiz Titular da 1ª Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, que veio a Portugal para participar na II Bienal de Jurisprudência de Direito da Família e dos Menores, vai realizar duas Conferências, uma no Porto e outra em Lisboa.

PORTO
Dia 26 de Outubro, às 18h30m, na Sala de Audiência dos Tribunal da Relação
O tema é:
"A EFECTIVAÇÃO DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. POLÍTICAS PÚBLICAS E CARÊNCIAS. CRIANÇAS NAS RUAS E VIOLÊNCIA CONTRA AS CRIANÇAS NO BRASIL"

LISBOA
Dia 28 de Outubro, às 18h30m, na Auditório do Centro de Estudos Judiciários
O tema é:
"JUSTIÇA DE MENORES NO BRASIL. COMPETÊNCIAS, PROGRAMAS SOCIAIS E MODUS OPERANDI"

Recomendo vivamente.

Legislação do dia

Portaria n.º 1350/2004. DR 250 SÉRIE I-B de 2004-10-23 – Ministério da Justiça: Fixa os termos a que obedece o registo das entidades certificadoras que emitem certificados qualificados

Portaria n.º 1351/2004. DR 250 SÉRIE I-B de 2004-10-23 – Ministério da Agricultura, Pescas e Florestas: Altera a Portaria n.º 677/2004, de 19 de Junho, que estabelece as regras nacionais complementares relativas aos fundos operacionais, aos programas operacionais e à ajuda financeira do Regulamento (CE) n.º 1433/2003, da Comissão, de 11 de Agosto

Portaria n.º 1352/2004. DR 250 SÉRIE I-B de 2004-10-23 – Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: Cria sobrescritos pré-franquiados de cor branca com a representação da franquia pré-impressa, identificada pela designação «Pré-pago» ou «Postage Paid» e por um logótipo de Correio Azul

Portaria n.º 1353/2004. DR 250 SÉRIE I-B de 2004-10-23 – Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: Aprova os novos modelos de cartão de identificação para o pessoal dos gabinetes dos membros do Governo do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, bem como para o pessoal dos serviços e organismos na sua dependência que não disponham de cartões de identificação próprios

Portaria n.º 1354/2004. DR 251 SÉRIE I-B de 2004-10-25 – Presidência do Conselho de Ministros: Cria a linha de financiamento Inclusão Digital - Linha de apoio financeiro ao Programa Nacional para a Participação dos Cidadãos com Necessidades Especiais na Sociedade da Informação

Despacho Normativo n.º 41/2004. DR 251 SÉRIE I-B de 2004-10-25 – Ministério da Segurança Social, da Família e da Criança: Aprova as normas que estabelecem os critérios de atribuição do subsídio de sobrevivência, do subsídio mensal complementar e dos apoios sociais de natureza eventual

Decreto-Lei n.º 218-A/2004. DR 251 SÉRIE I-A 1º SUPLEMENTO de 2004-10-25 – Ministério das Finanças e da Administração Pública: Aprova a 5.ª fase do processo de reprivatização do capital social da EDP - Electricidade de Portugal, S. A.

Portaria n.º 1130/2004 (2.ª série). DR 250 SÉRIE II de 2004-10-23 – Ministérios da Defesa Nacional, da Administração Interna e da Justiça: Define o trajo profissional dos juízes militares ao abrigo do disposto no artigo 11.º da Lei n.º 101/2003, de 15 de Novembro

Casa da Suplicação (IV)

Abuso de confiança fiscal — Aplicação da lei no tempo — Apropriação — Suspensão da pena — Constitucionalidade
1 – Se a lei do tempo da prática dos factos (RJFNA) exigia, para a verificação do crime de abuso fiscal, a apropriação em proveito próprio, pelo agente, das contribuições devidas, diversamente do que sucede com a lei actual (RGIT) é convocado o n.º 1 do art. 2.º do C. Penal e não o n.º 4, pois é à luz da lei no momento da prática dos factos que se dever determinar se a conduta é punível; se o não for, já não há lugar à ponderação da aplicabilidade de lei posterior que seria então sempre “desfavorável”.
2 – A apropriação a que se reporta o abuso de confiança fiscal previsto no RJFNA, satisfaz-se com a não entrega de contribuições ao Estado, dando-lhes outro destino, como tem entendido o Supremo Tribunal de Justiça: se o agente não entrega à administração tributária as prestações que deduziu e era obrigado a entregar, é porque se apropriou delas, dando-lhes assim um destino diferente daquele que lhe era imposto por lei.
3 – O art. 24.º, do RJIFNA (DL n.º 20-A/90, de 15-01, na redacção do DL n.º 294/93, de 24-11), ao falar em apropriação de prestação tributária que se estava obrigado a entregar ao credor fiscal, não conflitua com o disposto no art. 105.º, do RGIT (Lei n.º 15/01, de 05-06), que lhe sucedeu, uma vez que este último, embora não fale expressamente de apropriação, a ideia permanece no espírito do novo texto, ao acentuar a recusa ilegal de entrega à administração tributária da prestação. Na verdade, se o agente não faz entrega ao fisco das prestações que deduziu e era obrigado a entregar, é porque se apropriou delas, no sentido de que lhes deu destino diferente daquele que era imposto por lei, já que a ideia fulcral do crime de abuso de confiança, seja ele fiscal ou não, é sempre a de que se dá a valores licitamente recebidos um rumo diferente daquele a que se está obrigado (Ac. de 23/04/2003, CJ XXVIII, 1, 234)
4 – As normas dos artigos 11.º n.º 7 do RJIFNA e 14.º n.º 1 do RGIT não são inconstitucionais.
Ac. de 14.10.2004 do STJ, Proc. n.º 3274/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Crime de tráfico de estupefacientes — medida da pena — perda de veículo
1 – Sendo elevados os graus da ilicitude e da culpa, ressaltando no primeiro aspecto a insistência do arguido na prática criminosa, mesmo depois de uma primeira detenção, o longo período de tempo já provado em que se vem dedicando ao tráfico, e as quantidades já relevantes de droga que lhe foram encontradas, assim como a sua natureza, já que envolvendo as chamadas «drogas duras», portanto de efeitos mais perniciosos para a saúde dos consumidores, sem esquecer que o móbil provado foi o de obter lucros sem trabalhar, numa moldura penal de 4 a 12 anos de prisão, em que o ponto médio se situa nos 8 anos, e para onde, razoavelmente, ante os factos provados, se podia apontar a fixação da pena concreta, a de 6 anos que lhe foi aplicada já valoriza acima do atendível, a falta de antecedentes criminais conhecidos e a «jovem idade» do arguido, ambas de pouco relevo no caso.
2 - Declarado perdido a favor do Estado, um motociclo «por ter sido adquirido com proventos obtidos no tráfico de drogas», tal declaração é legal por respeito pelo disposto no artigo 35.º do DL n.º 15/93, de 22/1, na sua actual redacção, que estatui que «são declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados para a prática de uma infracção prevista no presente diploma ou que por esta tivessem sido produzidos», o que acontece, segundo o n.º 3 daquele dispositivo, ainda que «nenhuma pessoa determinada possa ser punida pelo facto», logo, independentemente da propriedade do veículo ser ou não do arguido.
Ac. De 14.10.2004 do STJ, proc. N.º 3204/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça — irrecorribilidade — demissão
1 – Não é admissível recurso «de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de infracções».
2 – Tal doutrina tem aplicação no caso de o acórdão proferido pela Relação, confirmativo de decisão da primeira instância, quando a medida abstracta da pena correspondente aos crimes, objecto da condenação, não seja superior a oito anos, mesmo que o tribunal da relação tenha reduzido a pena imposta aos recorrentes da decisão da primeira instância, ou aligeirado a pena, nomeadamente substituindo a pena de prisão por pena suspensa.
Ac. de 14.10.2004 do STJ, proc. n.º 2829/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Tráfico de estupefacientes — matéria de facto — competência do Supremo Tribunal de Justiça — estrangeiro não residente — pena acessória de expulsão
1 – No actual regime processual penal está fora do âmbito legal do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a reedição dos vícios apontados à decisão de facto da 1.ª instância, em tudo o que foi objecto de conhecimento pela Relação, mormente quando, para além do objecto do recurso já apreciado pelo tribunal recorrido, não se vislumbram outros vícios a que fosse mister dar resposta oficiosamente.
2 – Se não é de subestimar a gravidade do crime que o arguido decidiu cometer – tráfico de droga – importa ter em conta, contudo, que, dentro da relatividade das coisas, não atingindo o caso os limites quantitativos do «grande tráfico», embora a ele indelevelmente ligado, quanto mais não seja, como adjuvante na difusão pretendida, e não se tendo apurado outros factos desfavoráveis sobre a personalidade do arguido – a situação de ignorância que as instâncias deixaram pendente sobre o tema de facto não o pode desfavorecer – não desvalorizando ainda a circunstância de o recorrente não ter antecedentes criminais conhecidos, apesar dos seus actuais 38 anos de idade, enfim, usando de algum optimismo em que a pena de prisão cumpra um dos os seus objectivos primários – essencialmente, a ressocialização – deitando ainda um olhar de comiseração pela criança de 1 ano em quem o pai devia ter pensado antes e não pensou, enfim, tendo em conta que a situação de ilegalidade em que o arguido se encontra em Portugal tem outras vias para além da judicial para ser controlada, concorda-se em que possa ter existido algum excesso no decretamento da pena acessória de expulsão, que não é automático.
Ac. de 14.10.2004 do STJ, proc. n.º 3018/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

In dubio pro reo — Questão de facto — Presunções naturais
1 – O Supremo Tribunal de Justiça só pode sindicar a aplicação do princípio in dubio pro reo quando da decisão recorrida resulta que o Tribunal a quo ficou na dúvida em relação a qualquer facto e que, nesse estado de dúvida, decidiu contra o arguido. Não se verificando esta hipótese, resta a aplicação do mesmo princípio enquanto regra de apreciação da prova no âmbito do dispositivo do art. 127.º do CPP que escapa ao poder de censura do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista.
2 – Saber se o tribunal deveria ter ficado em estado de dúvida, é uma questão de facto que exorbita o poder de cognição do Supremo Tribunal de Justiça enquanto tribunal de revista.
3 – As conclusões ou ilações que as instâncias extraem da matéria de facto são elas mesmo matéria de facto que escapam à censura do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista.
4 – O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções
5 – O recurso às presunções naturais não viola o princípio in dubio pro reo. Elas cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto, pelo que aquele princípio constitui o limite àquele recurso.
Ac. de 21.10.2004 do STJ, proc. n.º 3274/04-5, Relator: Conselheiro Simas Santos

Tráfico de estupefacientes— co-autor — cúmplice — tráfico de menor gravidade — Atenuação especial da pena — perda de veículo automóvel — medida da pena — crime cometido na prisão
1 – Se um agente monta, a partir do estabelecimento prisional onde se encontrava detido, uma operação de tráfico de estupefacientes, na qual contou com a colaboração de outras pessoas, a actuação do co-arguido que no exterior (fora da cadeia), recebeu, guardou e posteriormente transportou num percurso de mais de 100 Km, mais de meio quilo de heroína, não se traduz em mera cumplicidade, mas sim em co-autoria.
2 – Com efeito, verifica-se a co-autoria quando cada comparticipante quer o resultado como próprio com base numa decisão conjunta e com forças conjugadas, bastando um acordo tácito assente na existência da consciência e vontade de colaboração, aferidas aquelas à luz das regras de experiência comum.
3 – E esse co-arguido «por qualquer título recebeu», «proporcionou a outrem», «transportou», e «ilicitamente detive» a droga, assim incorrendo com a sua actuação directa em 4 das situações prevista no n.º 1 do art. 21.º do DL n.º 15/93.
4 – Estando ainda provado agiu livre, consciente e voluntariamente, de acordo com plano prévio acordado com o co-arguido que estava na prisão – ao qual aderiu – de tráfico de estupefacientes, o que significa que aderiu ao projecto global e dele comparticipou numa actuação essencial à sua concretização: recebeu, transportou, deteve ilegalmente e ia entregar a heroína.
5 – Não se trata no caso de tráfico de menor gravidade, atendendo aos meios utilizados, à modalidade ou nas circunstâncias da acção (implicando a organização de esquema já sofisticado, com o dirigente na cadeia, dois ou mais indivíduos para obter a droga e entregá-la em Coimbra ao co-arguido, transporte para 100 Km, um encontro entre desconhecidos para a entrega da mesma droga) e à qualidade ou na quantidade das plantas ou substâncias (mais de 500 grs de heroína).
6 – Nem se trata de um correio de droga que, recrutado pela sua condição económica precária, recebe uma determinada quantia pré-fixada para efectuar o transporte de determinada quantidade de droga de um sítio para outro, normalmente envolvendo uma situação de importação, pois está assente a adesão ao um plano prévio acordado visando obter lucros que sabia serem ilegítimos.
7 – Não sendo no caso as circunstâncias atinentes à situação pessoal, económica e familiar do arguido, bem como a confissão parcial, com alguma relevância para a descoberta da verdade, o arrependimento e a vontade de reconstruir a sua vida e de adoptar comportamento em conformidade com as regras vigentes, suficientes para diminuir consideravelmente a culpa com que agiu, nem a necessidade da pena, atendendo aos fins de prevenção geral de integração que visa prosseguir, uma vez que o tipo de substância, a sua qualidade e as circunstâncias da acção, postulam acrescidas necessidades nesse domínio, não é de atenuar especialmente a pena.
8 – Mas já justificará esse condicionalismo a fixação da pena concreta em 4 anos e 6 meses de prisão.
9 - Face à redacção do n.º 1 do art. 35.º do DL 15/93 dada pela Lei n.º 45/96, de 3 de Setembro vem entendendo o STJ que, na criminalidade punida nesse diploma, a perda de objectos a favor do Estado, tratando-se de instrumentos do crime, depende apenas de um requisito em alternativa - que tenham servido, ou que estivessem destinados a servir, para a prática de uma infracção prevista naquele diploma; tratando-se de produtos, a declaração de perda depende tão só da sua natureza de ser um resultado da infracção e que, com a eliminação da 2.ª parte do art. 35.º, se pretendeu ampliar as situações em que a declaração de perda de objectos deverá ocorrer.
10 – Mas tem introduzido elementos moderadores a uma interpretação que conduza a uma aplicação automática do perdimento dos veículos automóveis, aferindo o nexo de instrumentalidade entre a utilização do objecto e a prática do crime com recurso à causalidade adequada, sendo exigível que a sua relação com a prática do crime se revista de um carácter significativo, numa relação de causalidade adequada, para que a infracção se verifique em si mesma ou na forma, com significação penal relevante, verificada.
11 – E tem convocado o princípio da proporcionalidade, no sentido que a perda do instrumentum sceleris terá de ser equacionada com esse princípio relativamente à importância do facto, de forma a não se ultrapassar a "justa medida".
12 – O veículo mostrou-se essencial em outros domínios que não o mero transporte se serviu para, parado e com os 4 piscas ligados no local combinado, assinalar a sua presença aos dois indivíduos que iam fazer a entrega da droga e, com a janela aberta como combinado, para recolher a droga que foi por aquela lançada e ainda para guardar a droga, levá-la para um depósito temporário, face à impossibilidade de se fazer a entrega no mesmo dia como esteve combinado. Pode, pois, afirmar-se que a utilização do veículo teve um papel importante no esquema de tráfico em que foi envolvido, não ofendendo o seu perdimento o princípio da proporcionalidade.
13 – Se o agente comandou a operação de tráfico a partir da sua cela, mas não está provado que a droga se destinasse à prisão, então não se verifica a agravante qualificativa da al. h) do art. 24.º do DL n.º 15/93, com a qual se quis também proteger aquela comunidade prisional.
14 – Mas essa circunstância deve ser atendida no quadro do art. 71.º do C. Penal, na medida concreta da pena, pois é patente o desprezo a que o agente votou os objectivos da condenação que está a cumprir, como potencia, pelo (mau) exemplo, que os outros presos enveredem pelo mesmo caminho, não só frustrando os objectivos de prevenção, como levando a deixar de lado a sua reinserção, enfim, pondo em causa todo o fim das penas que o sistema prisional é suposto acautelar.
Ac. de 21.10.2004 do STJ, proc. n.º 3205/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Homicídio voluntário — Tentativa — regime especial para jovens adultos — medida da pena — atenuação especial da pena — fins das penas
1 - Como está dito e redito, a atenuação especial prevista no Dec.Lei n.º 481/82, de 23/9 não é automática e tem de emergir de um julgamento do caso concreto que incuta na convicção do juiz a crença séria “sérias razões” de que para o arguido resultam vantagens para a sua reinserção. Porém, mesmo que verificadas aquelas condições, há sempre um limite que não pode ser ultrapassado – a defesa do ordenamento jurídico.
2 - O silêncio, sendo um direito do arguido, não pode prejudicá-lo, mas também dele não pode colher benefícios, nomeadamente a alegação de ter confessado os factos ou a demonstração de um qualquer laivo de arrependimento.
3 - A atenuação especial prevista no artigo 72.º do Código Penal, só cabe aplicar em casos especiais em que a imagem global do facto cria situações de tal forma específicas que o caso sai fora das molduras penais normais, já de si pensadas para abrangerem casos de ilicitude e culpa muito diversificados.
4 - A ressocialização é sempre um dos fins associados ao cumprimento de qualquer pena. Mas só funciona, «se possível», isto é, depois da necessária protecção de bens jurídicos, tal como emerge do disposto no artigo 40.º
Ac. de 21.10.2004 do STJ, proc. n.º 3242/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Tráfico de estupefacientes — correio da droga — medida da pena
A actividade do arguido, sendo de mero correio, não o situa na linha da frente da actividade traficante, antes, o remetendo para um papel importante na estratégia do tráfico, mas, apesar de tudo, de segundo plano.
Ac. de 21.10.2004 do STJ , proc. n.º3273/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira
Recurso extraordinário de revisão — assistência obrigatória de advogado — falta de pedido — rejeição
Deve ser rejeitado por falta de pedido o recurso extraordinário de revisão de sentença em que o recorrente formulou ele próprio o pedido e, tendo-lhe sido nomeado defensor, este veio dizer que não havia fundamento para a revisão, mas antes para a descriminalização da conduta em relação a um dos crimes por que foi condenado.
Ac. de 21.10.04 do STJ, proc. n.º 1262/04 – 5, Relator: Cons. Rodrigues da Costa

Tráfico de estupefacientes — correio — medida da pena — rejeição — manifesta improcedência
É manifestamente improcedente e, por isso, deve ser rejeitado, o recurso em que o arguido pede a atenuação especial da pena ou, em alternativa, a sua fixação em 4 anos, quando foi condenado em 4 anos e 6 meses de prisão por ter transportado 3.149,600 grs. de cocaína num voo procedente de Santiago do Chile, via S. Paulo – Brasil e com destino a Espanha, estando provadas apenas, como atenuantes, a confissão (tendo sido apanhado em flagrante delito), o ter-se mostrado arrependido, viver em casa dos progenitores com a mulher e a filha de 9 meses, ser operador de máquinas numa fábrica metalúrgica e ter frequentado o ensino secundário.
Ac de 21.10.04 do STJ, proc. n.º 2940/04 – 5, Relator: Cons. Rodrigues da Costa

Nascimento de Georges Bizet (25-10-1838)

Nascido em Paris, rapidamente é incentivado pelos pais, também músicos, a entrar no conservatório de música de Paris antes mesmo de ter 10 anos.
Torna-se mestre de canto na ópera cómica em 1871.
É conhecido sobretudo pela sua obra, a célebre ópera "Carmen", composta em 1874, que ainda hoje é a mais tocada em todo o mundo.
Morreu subitamente, em 1875, quando tinha 37 anos.

Fragmentos da ópera "Carmen":

Obertura
Habanera
Entreacto II
Aragonesa
Seguidilla (canta María Callas)
La fleur que tu m'avais jetée (canta Plácido Domingo)
Toreador en garde (canta Ruggero Raimondi)

P.S. - Neste dia, também nasceram Johann Strauss, compositor austríaco (1825), e Pablo Picasso, pintor e escultor espanhol (1881).

domingo, 24 de outubro de 2004

Les deux justices

STEINLEN, « Le jugeur. De l’encre, du sang et des larmes ». In L'Assiette au Beurre, 14. 11. 1903

Juizos Paralelos – Comunicação Social e Justiça

J. A. Souto Moura, Juizos Paralelos – Comunicação Social e Justiça – Um Contributo para o Levantamento da Realidade Portuguesa (Intervenção do Procurador-Geral da República, proferida em Badajoz, no dia 18-10-2004, por ocasião da V Edição “Ágora. El Debate Peninsular”, subordinada ao tema “¿PRENSA 0 TRIBUNALES? Los juicios paralelos a debate”)

Código Penal espanhol

Uma edição muito recente do Código Penal espanhol (Outubro de 2004), de Juan J. Queralt, que pode abrir e descarregar aqui.

sábado, 23 de outubro de 2004

Termes juridiques

Um léxico jurídico de termos franceses e ingleses, muito completo, posto à disposição pela Commission de Terminologie Juridique du Québec, que lhe dá uma autoridade segura.
A consultar aqui.

sexta-feira, 22 de outubro de 2004

Compêndio Jurídico da Sociedade de Informação

Saiu o livro Compêndio Jurídico da Sociedade de Informação da autoria do Sr. Juiz de Círculo Dr. Joel Timóteo Ramos Pereira.
Trata, em 1072 páginas, das matérias mais relevantes da sociedade da informação. Dos princípios fundamentais e constitucionais, acessibilidade, administração pública, alojamento de sítios, artwork e webdesign, assinatura electrónica, bases de dados, comércio electrónico, contratos electrónicos, consumidores e contratos à distância, conteúdos de internet, cibercriminalidade, documentos electrónicos, factura electrónica, fiscalidade e tributação, moeda electrónica, nomes de domínio, propriedade intelectual, publicidade e consultoria, responsabilidade civil, sociedade da informação, spam, teletrabalho, tribunais e direito processual. E fá-lo numa linguagem acessível sem perda de rigor.
Inclui ainda um dicionário temático e a recente Convenção sobre o Cibercrime, em português.

quinta-feira, 21 de outubro de 2004

Acórdão de Fixação de Jurisprudência

Foi hoje aprovado, com 13 votos a favor 4 contra, o seguinte acórdão uniformizador de jurisprudência:
Decisão instrutória - nulidades e questões prévias ou incidentais - recurso - subida imediata
«Sobe imediatamente o recurso da parte da decisão instrutória respeitante às nulidades arguidas no decurso do inquérito ou da instrução e às demais questões prévias ou incidentais, mesmo que o arguido seja pronunciado pelos factos constantes da acusação do Ministério Público.»
Supremo Tribunal de Justiça
Acórdão de 21 de Outubro de 2004
Processo n.º 3668/03-5
Relator: Cons. Simas Santos

Para ler o texto completo clique aqui...

Legislação do dia

Declaração de Rectificação n.º 91/2004. DR 248 SÉRIE I-B de 2004-10-21 – Presidência do Conselho de Ministros: De ter sido rectificada a Portaria n.º 1085-A/2004, do Ministério da Justiça, que fixa os critérios de prova e de apreciação da insuficiência económica para a concessão da protecção jurídica, publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 205, de 31 de Agosto de 2004

quarta-feira, 20 de outubro de 2004

Le coup de barre

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DESCLOZEAU, Le coup de barre

Tribunal Constitucional

Acórdão n.º 564/2004. DR 247 SÉRIE I-A de 2004-10-20 – Tribunal Constitucional: Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por violação do disposto nos artigos 2.º, 111.º, n.º 3, e 205.º, n.º 2, da Constituição, da norma constante do n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 85/2001, de 4 de Agosto, na parte em que determina que, na execução das sentenças anulatórias dos actos de liquidação, será deduzida, na restituição da quantia paga, a parcela correspondente à participação emolumentar dos funcionários dos registos e do notariado

Declaração n.º 13-A/2004. DR 246 SÉRIE I-A 1º SUPLEMENTO de 2004-10-19 – Tribunal Constitucional: Declara ter sido cooptada para preencher uma vaga de juiz do Tribunal Constitucional a Prof.ª Doutora Maria João da Silva Baila Madeira Antunes

terça-feira, 19 de outubro de 2004

Novo Vice-Presidente do STJ

Ver aqui.

Legislação do dia

Portaria n.º 1324/2004. DR 246 SÉRIE I-B de 2004-10-19 – Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios das Finanças e da Administração Pública, das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: Fixa o montante mínimo de seguro de responsabilidade civil na actividade imobiliária

Portaria n.º 1326/2004. DR 246 SÉRIE I-B de 2004-10-19 – Ministérios das Actividades Económicas e do Trabalho, das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional, da Ciência, Inovação e Ensino Superior e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: Define a avaliação da capacidade profissional, bem como os critérios de adequação da formação, no acesso e permanência nas actividades de mediação imobiliária e angariação imobiliária

Portaria n.º 1327/2004. DR 246 SÉRIE I-B de 2004-10-19 – Ministérios das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: Regulamenta os procedimentos administrativos previstos no Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto, que regula o regime jurídico das actividades de mediação imobiliária e de angariação imobiliária

Portaria n.º 1328/2004. DR 246 SÉRIE I-B de 2004-10-19 – Ministérios das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: Fixa os montantes das taxas devidas no âmbito dos procedimentos administrativos previstos no regime jurídico das actividades de mediação imobiliária e de angariação imobiliária

Uma revista jurídica italiana on line


Direttore Francesco Brugaletta

segunda-feira, 18 de outubro de 2004

"Grands systèmes juridiques comparés"...

... é um curso de direito comparado ministrado por Jean-Paul PAYRE, Maître conférences public, que tem por objecto comparar, em traços gerais, os três grandes sistemas jurídicos: o sistema romano-germânico, a common law (inglesa e americana) e a família das religiões muçulmanas.
Consulte aqui.

Recomendação do Conselho da Europa sobre o voto electrónico

Pode consultar aqui a Recommandation Rec(2004)11 du Comité des Ministres aux Etats membres sur les normes juridiques, opérationnelles et techniques relatives au vote électronique (adoptée par le Comité des Ministres le 30 septembre 2004, lors de leur 898e réunion des Délégués des Ministres)

Legislação do dia

Portaria n.º 1322/2004. DR 244 SÉRIE I-B de 2004-10-16 – Ministério da Justiça: Declara instalados o 1.º e o 2.º Juízos de Execução da Comarca de Lisboa e o 1.º Juízo de Execução da Comarca do Porto e cria a Secretaria-Geral de Execução do Porto

Portaria n.º 1105/2004 (2.ª série). DR 244 SÉRIE II de 2004-10-16 – Ministérios das Finanças e da Administração Pública e da Justiça: Fixa a taxa supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou colectivas

Declaração de Rectificação n.º 89/2004. DR 245 SÉRIE I-A de 2004-10-18 – Presidência do Conselho de Ministros: De ter sido rectificado o Decreto-Lei n.º 215-A/2004, da Presidência do Conselho de Ministros, que aprova a orgânica do XVI Governo Constitucional, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 208 (suplemento), de 3 de Setembro de 2004

Portaria n.º 1323-A/2004. DR 245 SÉRIE I-B 1º SUPLEMENTO de 2004-10-18 – Ministérios das Finanças e da Administração Pública e da Educação: Estabelece o ajustamento anual da rede escolar para 2004-2005, com a consequente criação, extinção e transformação de escolas

domingo, 17 de outubro de 2004

DEBATE ¿Hay que aprobar la Constitución europea?

Vem publicado no El País de hoje um debate sobre a aprovação da Constituição Europeia.

CARLOS CARNERO, eurodeputado socialista, membro da Comissão de Assuntos Constitucionais do Parlamento Europeu e da Convenção Europeia, elenca as Razones para el 'sí' (ler aqui), e

ANTONIO ESTELLA, professor titular de Direito Administrativo da Universidad Carlos III, expõe Las razones del 'no' (ler aqui).

Montesquieu, DE L’ESPRIT DES LOIS (1748)

- Première partie: livres I à VIII

- Deuxième partie: livres IX à XIII

- Troisième partie: livres XIV à XIX

- Quatrième partie: livres XX à XXIII

- Cinquième partie: livres XXIV à XXVI

- Sixième partie: livres XXVII à XXXI

- Défense de De l'esprit des lois (1750)

- Table analytique et alphabétique des matières contenues dans De l'Esprit des lois et Défense de l'Esprit des lois (1758)

sábado, 16 de outubro de 2004

Composition

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Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992)
Composition (1936) - Óleo sobre tela

CASA DA SUPLICAÇÃO (III)

Ofensa à integridade física — perigo para a vida — medida da pena
1 - Tendo o arguido atingido o ofendido a curta distância com um tiro de arma caçadeira na coxa esquerda e provocando-lhe rompimento de vasos sanguíneos, originando, assim, a necessidade de uma intervenção cirúrgica nas horas imediatas, foi criado perigo para a vida do ofendido, que, aliás veio a falecer por não ter sido socorrido a tempo.
2 - Tendo em conta que o recorrente se intrometeu numa questão com a qual nada tinha a ver, pois o tribunal competente tinha regulado o poder paternal, confiando a menor à guarda e cuidado de ambos os pais, estando na companhia do pai, quando o recorrente foi, acompanhado da mãe dela, fazer àquele a exigência da sua entrega; que, prevendo o pior, foi armado de uma espingarda caçadeira, que usou sem hesitar, depois de ter ido buscá-la ao carro de caso pensado, quando ele próprio provocou a situação, e isto muito embora se conceda (porque está na matéria de facto) que o recorrente disparou, parecendo-lhe ter ouvido «um ruído de ferro a embater no solo» - prenúncio (suposto) de utilização de um qualquer objecto de agressão;
3 - Sendo o recorrente, além disso, guarda prisional e tendo, por isso, muito mais obrigação de agir de outro modo, de ser muito mais prudente, de ter uma outra premonição relativamente ao fazer-se acompanhar de uma arma caçadeira em circunstâncias destas e, sobretudo, de ter uma maneira superior de se comportar em face de tais situações, consciente como devia estar dos perigos de utilização de uma arma como a que ele transportava, e da forma como o fez, mostra-se adequada a pena de 4 anos de prisão que, em recurso do Ministério Público, foi fixada pela Relação.
Ac. de 30.9.04 do STJ, proc. n.º 1793/04, Relator: Cons. Rodrigues da Costa

Furto qualificado — modo de vida
1 - Tendo o arguido praticado 7 crimes de furto num espaço de tempo muito pequeno – um espaço de pouco mais de três meses – tal não permite a largueza suficiente para se concluir que ele fez do crime de furto modo de vida, muito embora a prática repetida de vários crimes de furto seja um dos elementos a considerar para alicerçar esse juízo.
2 - Por outro lado, não estando provado que o arguido viveu à custa desses furtos, ao menos parcialmente (isto é, em regime de part time), sabendo-se, isso sim, que ele estava dependente de heroína e que alimentou parte do seu vício com os furtos praticados, uma tal situação pode mais facilmente remeter para «um acto de desespero» momentâneo, do que propriamente para um esquema de vida, uma opção que ele tenha feito para viver à custa dos proventos assim obtidos.
3 - Os furtos por ele praticados poderiam vir mais por «pressão» do vício - e é o mais normal que assim seja – do que por um modo de vida, que implica sempre uma opção no sentido de estruturar a vida quotidiana, total ou parcialmente, na prática desses actos ilícitos, como forma de angariar os «proventos necessários à vida em comunidade». Tal implica, de facto, uma estabilidade, no sentido de regularidade e permanência, ainda que essa prática não tenha durado por um grande lapso de tempo.
Ac. de 30.9.04 do STJ, proc. n.º 2030/04 – 5, Relator: COns. Rodrigues da Costa

Tráfico de droga — correio — tráfico de menor gravidade — medida da pena
1 - Em relação ao tipo de estupefaciente, é inegável que a cocaína é uma das chamadas drogas duras, devido ao seu alto poder viciante e ao seu efeito nocivo para a saúde do consumidor, bem como à nocividade social que o seu consumo em larga escala provoca, com a consequente «desestruturação» que acarreta a tal nível.
2 - Tendo em consideração esses efeitos, o traficante que coloca um tal produto no mercado, ainda mais se o for em grandes quantidades, ofende de forma elevada os valores comunitários ou os bens jurídicos que se visam proteger com a norma incriminadora.
3 - Tendo a recorrente sido surpreendida com uma quantidade de 14.804,842 gramas de cocaína – uma quantidade muito elevada, que daria para uma disseminação da droga por milhares de indivíduos – é manifesto que tal actividade não pode ser enquadrada no crime de tráfico de menor gravidade.
4 – Mostra-se correcta a pena aplicada de 7 anos e 6 meses de prisão para o crime de tráfico consistente em a arguida ter transportado aquela quantidade de cocaína da Venezuela até Portugal, sendo o destino afinal desse produto a vizinha Espanha.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 2834/04 – 5, Relator: Cons. Rodrigues da Costa

Dupla conforme — concurso de crimes — pena única — recorribilidade para o STJ
1 - Para efeito de admissibilidade de recurso, quanto à medida da pena, para o STJ, estando em causa um concurso de crimes, não é a moldura penal correspondente a cada tipo de crimes que está em causa, mas, antes, a moldura penal do concurso.
2 - Tendo o arguido cometido cinco crimes de furto simples, um outro de média gravidade e outro de gravidade mais acentuada, e ainda um crime de danificação de documento, acrescendo a estes um crime de condução sem diploma habilitante, tudo no espaço de muitos poucos dias, e tendo o arguido 18 anos de idade, não será de concluir, ao menos por força do princípio in dubio pro reo, pela tendência do arguido par a prática de crimes e, nomeadamente de tipo patrimonial.
3 - Esta pluriocasionalidade, aliada à imaturidade do arguido, tem de ser levada em conta, de forma sensível, na medida da pena única.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 2493/04-5, Relator: Cons. Rodrigues da Costa

Falsificação de documentos — opção pela pena de multa — suspensão da execução da pena — apreciação implícita
1 – Quando o Tribunal entende verificados os elementos de um crime, como o de falsificação de documentos autênticos, punível, em alternativa, com pena privativa e pena não privativa da liberdade tem de escolher qual das duas espé­cies de pena vai aplicar e justificar por que não dará preferência à multa alternativa.
2 – Se o faz dizendo, além do mais, que “a pena não privativa de liberdade não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, além de resolver explicitamente a questão de opção pela pena detentiva, resolve também implicitamente, pela negativa, a questão da suspensão da execução da pena que tem de enfrentar sempre que fixa a pena de prisão abaixo dos 3 anos de prisão.
Ac. de 14.10.04 do STJ, proc. n.º 3181/04-5, Relator: Cons. Carmona da Mota

Abuso sexual de menor — medida concreta da pena
1 – Encontrada a moldura penal abstracta, é nela que funcionam todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente, designadamente:
– O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente);
– A intensidade do dolo ou negligência;
– Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
– As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
– A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
– A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
2 – Se no caso concreto:
– o dolo é directo e intenso, com o arguido a tomar, na óptica da decisão recorrida, uma única resolução de praticar, por variadas vezes coito anal com o ofendido então com 12 e 13 anos e a procurar enfraquecer a vontade do ofendido com diversas ofertas, e ameaças de revelar os factos ocorridos à mãe deste, sabendo que com a sua conduta poderia prejudicar a saúde, física e mental, deste;
– é grande a ilicitude com a actuação do arguido a prolongar-se entre meados do ano de 2002 e 31 de Agosto de 2003, em, pelo menos, 20 episódios;
– sendo graves consequências da sua actuação para o ofendido que sofreu e sofre de grave traumatismo psicológico e desorientação em relação à sua formação sexual, com sentimentos de culpa, vergonha, desconforto e angústia consigo mesmo, encontrando-se a ser acompanhado tecnicamente, tendo o seu aproveitamento escolar diminuído, com sentimentos de vergonha perante colegas e professora, sendo que esta tomou conhecimento do ocorrido;
– e o arguido confessou parcialmente no final da audiência de julgamento, sem revelar arrependimento sincero, sendo de modesta condição social e económica, analfabeto, trabalhar e não apresentar qualquer antecedente criminal;
não merece censura a pena de 7 anos de prisão fixada pela 1.ª Instância para a prática do crime de abuso sexual de criança agravado.
Ac. de 14.10.04 do STJ, proc. n.º 3193/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Homicídio qualificado tentado — medida da pena — comportamento anterior da vítima
1 – Encontrada a moldura penal abstracta, é nela que funcionam todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente, designadamente:
– O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente);
– A intensidade do dolo ou negligência;
– Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
– As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
– A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
– A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
2 – Se no caso concreto:
– o dolo é directo e intenso com os 2 arguidos a atacarem, pelas costas o ofendido que estava ocupado a segurar uma terceira pessoa com o fito de desapertar uma contenda, com 4 facadas na zona do coração, só o deixando quando aquele caiu no solo, em nada contribuindo a vítima para esta actuação concertada dos arguidos que não estavam envolvidos na discussão e agressões a que o ofendido procurou obviar, intervindo para a apaziguar, não estando provado que conhecessem o indivíduo que o arguido segurava.;
– essa actuação foi completamente gratuita e caracterizada pela traição, bem como pela superioridade advinda também das armas e co-autoria
– e grande a ilicitude, sendo certo que o ofendido sofreu 4 feridas incisas na região dorsal do hemitórax esquerdo e perfuração do pulmão esquerdo, lesões que exigiram uma intervenção cirúrgica de urgência e colocaram em risco a sua vida, causando-lhe 90 dias de doença particularmente dolorosa, todos com incapacidade para o trabalho.
– os arguidos eram delinquentes primários e trabalhavam, mas não está provado o seu bom comportamento anterior e se alhearam do tribunal em julgamento, não assumiram os factos deles dando uma versão reveladora de uma personalidade mal formada e desprovida de auto-censura,
Mostra-se adequada a pena de 4 anos e 6 meses de prisão pelo crime tentado de homicídio qualificado, devendo, no entanto, diminuir-se em 6 meses a pena do arguido menor de 18 anos, por razões de justiça relativa.
Ac. de 14.10.04 do STJ, proc. n.º 3220/03-5, Relator: Cons. Simas Santos

Arquivamento parcial dos autos — homicídio simples tentado — medida da pena — culpa e ilicitude
1 – Se em recurso se estabelece que o arguido foi condenado como autor de um crime de ofensas corporais simples, sob acusação do Ministério Público, sem que tenha havido queixa do ofendido, os autos devem ser, nessa parte, arquivados.
2 – Encontrada a moldura penal abstracta, é nela que funcionam todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente, designadamente o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente (grau de ilicitude do facto); a intensidade do dolo ou negligência; os fins ou motivos que determinaram o cometimento do crime e os sentimentos manifestados; a situação económica e as condições pessoais do agente; a conduta anterior e posterior ao facto (nomeadamente o destinado a reparar as consequências do crime); e ainda a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3 – Se no caso concreto:
– o arguido, numa avenida movimentada de uma cidade, bem sabendo que pode atingir várias pessoas o que aceita, dispara, por ciúme, 3 tiros pelas costas do ofendido, atingindo-o e -a mais 3 pessoas, tendo todos sofrido intervenções cirúrgicas, fugindo depois do local;
– sendo embora bem conceituado socialmente e inserido socialmente, sem antecedentes criminais e tem mantido comportamento prisional sem reparo, indemnizado os ofendidos e se declarado arrependido,
mostra-se adequada a pena de 3 anos de prisão pelo crime tentado de homicídio simples, por ser intensa a culpa e grande a ilicitude da sua conduta.
Ac. de 14.10.04, do STJ, proc. n.º 3232/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Tráfico de droga — cocaína — tráfico de menor gravidade — medida da pena
1 - Tendo a recorrente sido surpreendida com uma quantidade de 2.143,448 gramas de cocaína – uma quantidade elevada, que daria para uma considerável disseminação da droga – é manifesto que tal actividade não pode ser enquadrada no crime de tráfico de menor gravidade.
2 – Reputa-se correcto aplicar à recorrente a pena de 5 anos de prisão, em vez dos 6 anos e 6 meses em que foi condenada na 1ª instância, para o crime de tráfico consistente em a arguida ter transportado aquela quantidade de cocaína da Venezuela até Portugal, sendo a Holanda o destino afinal desse produto.

Ac. de 14.10.04 do STJ, proc. n.º 2811/04 – 5, Relator: Cons. Rodrigues da Costa

sexta-feira, 15 de outubro de 2004

Dispensa do pagamento de custas

Estará um Juiz de Direito dispensado do pagamento de custas pela interposição de recurso para o Tribunal Constitucional de despacho que o pronunciou pela prática de um crime cometido no exercício de funções?
A 1.ª Secção do Tribunal Constitucional entendeu que não, por não caber no âmbito do artigo 17.º, n.º 1, al. g), do Estatuto dos Magistrados Judiciais a prática de actos que extravasam a função de julgar, como é o caso do acto que se valora, no despacho recorrido, como ilícito criminal.
Para mais desenvolvimentos, consultar os acórdãos, que a seguir se ligam, n.ºs 369/2004, de 25-5-2004, e 507/2004, de 13-7-2004.

Legislação do dia

Resolução da Assembleia da República n.º 65/2004. DR 243 SÉRIE I-A de 2004-10-15 – Assembleia da República: Eleição de três membros para o Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações

Resolução da Assembleia da República n.º 66/2004. DR 243 SÉRIE I-A de 2004-10-15 – Assembleia da República: Recomenda ao Governo a tomada de medidas com vista ao desenvolvimento do software livre em Portugal

quinta-feira, 14 de outubro de 2004

SCIENTIA IVRIDICA

Está em distribuição o nº 299, respeitante a Maio-Agosto de 2004, desta Revista da Escola de Direito da Universidade do Minho.
Destaca-se a Anotação do Professor Nuno Manuel Pinto Oliveira ao Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 3/2004, de 25 de Março (Responsabilidade pelo Risco: Limites Máximos de Indemnização), em que se conclui que o mesmo «consagrou um critério de decisão contrário à lei e, por isso, fundamentalmente errado

*
A assinatura anual (3 números) custa 37,50 euros e deve ser solicitada à Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4704-553 Braga.

Competência reservada da Polícia Judiciária. Crime de ameaças com utilização de arma de fogo

O crime de ameaças, p. e p. nos termos do artigo 153.° do Código Penal, quando cometido com recurso a arma de fogo, não está incluído na competência reservada da Polícia Judiciária prevista no artigo 4.º, al. n) da Lei n.° 21/2000, de 10 de Agosto e artigo 5.º, n.° 2, a1. n) do Decreto-Lei n.° 275/A-2000, de 9 de Novembro, podendo a competência para a investigação daquele crime ser delegada noutro órgão de polícia criminal.

Despacho do Vice Procurador-Geral da República, de 6.Out.2004

Le gouvernement propose une réforme de la justice...

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PLANTU, «Le gouvernement propose une réforme de la justice pour en assurer l’indépendance» - Le Monde, 22-10-1997.

Diferenças

Na área da Justiça, George W. Bush defende:
- a pena de morte;
- a imunidade dos fabricantes de armas em caso de serem demandados civilmente.
E John Kerry recusa:
- a pena de morte, excepto em situações pontuais como seja o terrorismo:
- a imunidade dos fabricantes de armas em caso de serem demandados civilmente.

Le ministre de la Justice assiste à une audience de plaider-coupable à Paris

Le ministre de la Justice Dominique Perben a assisté jeudi matin au palais de justice de Paris à une audience d'homologation dans le cadre d'une procédure de comparution sur reconnaissance préalable de culpabilité (CPRC), dite plaider-coupable. Innovation contestée de la loi Perben II entrée en vigueur le 1er octobre, des CRPC ont déjà été homologuées "une cinquantaine de fois" en France, selon le ministre, et 340 de ces procédures sont en cours dans environ 60 tribunaux. A Paris, le parquet a comptabilisé, depuis le 4 octobre, 13 procédures de CRPC dont 3 n'ont pas été homologuées. Le ministre a assisté à l'homologation d'une peine proposée à un homme poursuivi pour conduite en état d'ivresse (0,47 mg/l), conduite sans permis et sans assurance. Le parquet lui avait proposé une peine de 3 mois de prison avec sursis et deux ans de mise à l'épreuve durant laquelle l'intéressé devra soigner son problème d'alcool. A l'issue d'une audience à laquelle assistait une trentaine de personnes dont le président du tribunal de grande instance (TGI) de Paris, Jean-Claude Magendie, et le procureur de la République Yves Bot, sous l'oeil de caméras exceptionnellement autorisées à filmer, M. Perben a souligné l'intérêt "pédagogique" de cette procédure où la peine pour être homologuée doit auparavant être acceptée par le prévenu. Cependant lors de l'audience, particulièrement longue de l'avis de magistrats et d'avocats présents, le prévenu a eu du mal à expliquer en quoi consistaient les obligations liées à la mise à l'épreuve. Tout juste a-t-il su expliquer que s'il ne respecte pas ces obligations "il n'y a plus de sursis".Les avocats parisiens restent partagés sur cette procédure. Tous hostiles lors de l'adoption du texte en février, certains ont décidé d'être pragmatiques et, à l'image de bâtonnier, Jean-Marie Burguburu, de "voir de bonne foi si ça marche".Président de l'association des avocats pénalistes (ADAP), Jean-Yves Leborgne a ainsi souligné le rôle de l'avocat dans la discussion avec le procureur lors de la proposition de peine. D'autres avocats restent opposés, estimant au contraire que l'avocat n'a qu'un "rôle de plante verte" puisqu'il ne peut pas y avoir de réelle "négociation" entre l'avocat et le parquet mais seulement acceptation ou non d'une proposition. Ils ont dénoncé "la mascarade d'audience" présentée au garde des Sceaux. Le ministre de la Justice a également visité les nouveaux locaux d'accueil des victimes situés au rez-de-chaussée du palais de justice où travaille un personnel "particulièrement formé à l'accueil des victimes"
AFP 14.10.04 (Le Monde)

AUDIÇÕES COM AS PROFISSÕES JURÍDICAS NO ÂMBITO DO PACTO DE REGIME

Segundo consta aqui, o Ministro da Justiça tem vindo a receber os representantes das diferentes profissões jurídicas no âmbito do Pacto de Regime, tratando-se de uma ronda de audições com objectivo de recolher os contributos dos parceiros da justiça para o debate sobre as reformas necessárias. No passado dia 12 de Outubro (3ª feira), foi ouvido o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, ontem a Associação dos Funcionários Judiciais, e hoje serão auscultados a Associação Sindical dos Juízes Portugueses e a Ordem dos Advogados. A Câmara dos Solicitadores ficará para data ainda a definir.

Actualização: as audições dos representantes da Associação Sindical do Juízes e da Ordem dos Advogados foram adiadas para amanhã (sexta-feira) e a da Câmara dos Solicitadores foi agendada para segunda-feira (18 de Outubro). Ver aqui.

quarta-feira, 13 de outubro de 2004

Tribunal Constitucional

Acórdão n.º 491/2004 – DR 241 SÉRIE II de 2004-10-13: Não declara a inconstitucionalidade das normas contidas nos artigos 1.º, 2.º, 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º 40/2001, de 9 de Fevereiro [respeitantes à revisão das taxas contributivas previstas no Decreto Regional n.º 26/79/M, de 7 de Novembro]

Nomeação de novo subdirector nacional-adjunto na Directoria do Porto da Polícia Judiciária

Por Despacho do Ministro da Justiça foi nomeado subdirector nacional-adjunto na Directoria do Porto da Polícia Judiciária, em comissão de serviço, o licenciado Artur Joaquim Fernandes Pereira, possuidor de reconhecida aptidão e experiência profissional adequada ao exercício das referidas funções.

Legislação do dia

Decreto-Lei n.º 218/2004. DR 241 SÉRIE I-A de 2004-10-13 – Ministério da Agricultura, Pescas e Florestas: Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/126/CE, da Comissão, de 23 de Dezembro, relativa ao método analítico para a determinação de constituintes de origem animal no quadro do controlo oficial dos alimentos para animais, revogando o Decreto-Lei n.º 46/99, de 12 de Fevereiro

Portaria n.º 1307/2004. DR 241 SÉRIE I-B de 2004-10-13 – Ministérios da Defesa Nacional, das Finanças e da Administração Pública e da Segurança Social, da Família e da Criança: Regula o quadro legal e fixa as normas de funcionamento e gestão do Fundo dos Antigos Combatentes

Decreto-Lei n.º 217-B/2004. DR 238 SÉRIE I-A 1º SUPLEMENTO de 2004-10-09 – Ministério da Agricultura, Pescas e Florestas: Aprova a orgânica da Agência Portuguesa de Segurança Alimentar, I. P.

Decreto-Lei n.º 217-A/2004. DR 237 SÉRIE I-A 1º SUPLEMENTO de 2004-10-08 – Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território: Prorroga, até 31 de Dezembro de 2005, o prazo de elaboração dos planos de ordenamento das áreas protegidas estabelecido no Decreto-Lei n.º 204/2002, de 1 de Outubro

terça-feira, 12 de outubro de 2004

CASA DA SUPLICAÇÃO (II)

Sendo a informação jurídica importante mas volátil, o seu conhecimento atempado, numa modalidade sintética, reveste-se de grande utilidade.
Daí que se continue a fornecer aqui, sob forma de sumários, a indicação da jurisprudência mais recente da 5.ª Secção (Criminal) do Supremo Tribunal de Justiça, até que essa utilidade cesse.

Recurso de matéria de facto — especificação dos pontos de factos incorrectamente julgados — meios de prova que impõem resposta diferente — convite à correcção das conclusões — texto da motivação — constitucionalidade
1 - O Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar inconstitucional, por violação dos direitos a um processo equitativo e do próprio direito ao recurso, as normas dos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP na interpretação segundo a qual o incumprimento dos ónus aí fixados, conduz à rejeição do recurso, sem a possibilidade de aperfeiçoamento (cfr. Acs de 26-9-01, proc. n.º 2263/01, de 18-10-01, proc. n.º 2374/01, de 10-04-02, proc. n.º 153/00 e de 5-6-02, proc. n.º 1255/02)
2 - Se o recorrente não deu cabal cumprimento às exigências do n.º 3 e especialmente do n.º 4 do art. 412.º do CPP, nas conclusões da motivação, mas o fez no texto dessa motivação, a Relação não pode sem mais rejeitar o recurso em matéria de facto, nem deixar de o conhecer, por ter por imodificável a matéria de facto, nos termos do art. 431.º do CPP.
3 - Este último artigo, como resulta do seu teor, não toma partido sobre o endereçar ou não do convite ao recorrente, em caso de incumprimento pelo recorrente dos ónus estabelecidos nos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º, antes vem prescrever, além do mais, que a Relação pode modificar a decisão da 1.ª instância em matéria de facto, se, havendo documentação da prova, esta tiver sido impugnada, nos termos do artigo 412.º, n.º 3, não fAZ endo apelo, repare-se, ao n.º 4 daquele artigo, o que no caso teria sido infringido.
4 - Saber se a matéria de facto foi devidamente impugnada à luz do n.º 3 do art. 412.º é questão que deve ser resolvida à luz deste artigo e dos princípios constitucionais e de processo aplicáveis, e não à luz do art. 431.º, al. b), cuja disciplina antes pressupõe que essa questão foi resolvida a montante.
5 - Entendendo a Relação que o recorrente não forneceu os elemento legais necessários para reapreciar a decisão de facto nos pontos que questiona, a solução não é "a improcedência", por imodificabilidade da decisão de facto, mas o convite para a correcção das conclusões.
6 – A ausência de tal convite e a subsequente ausência de pronúncia sobre matéria que devia conhecer torna nulo o acórdão da Relação.
7 – Assim o vem decidindo também o Tribunal Constitucional, Acs. n.º 259/03, DR, IIS, de 13.02.02 e n.º 140.04, DR, IIS, de 17-4-04 que distingue a deficiência resultante da omissão na motivação dessas especificações, caso em que o vício seria insanável, da omissão de levar as especificações constantes do texto da motivação às conclusões, situação que impõe o convite à correcção.
Ac. do STJ de 07.10.2004, proc. n.º 3286/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Princípio in dubio pro reo — questão de facto — presunções naturais
1 – O Supremo Tribunal de Justiça só pode sindicar a aplicação do princípio in dubio pro reo quando da decisão recorrida resulta que o Tribunal a quo ficou na dúvida em relação a qualquer facto e que, nesse estado de dúvida, decidiu contra o arguido. Não se verificando esta hipótese, resta a aplicação do mesmo princípio enquanto regra de apreciação da prova no âmbito do dispositivo do art. 127.º do CPP que escapa ao poder de censura do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista.
2 – Saber se o tribunal deveria ter ficado em estado de dúvida, é uma questão de facto que exorbita o poder de cognição do Supremo Tribunal de Justiça enquanto tribunal de revista.
3 – As conclusões ou ilações que as instâncias extraem da matéria de facto são elas mesmo matéria de facto que escapam à censura do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista.
4 – O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções
5 – O recurso às presunções naturais não viola o princípio in dubio pro reo. Elas cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto, pelo que aquele princípio constitui o limite àquele recurso.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 3274/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Recurso de revisão — fundamentos — novos meios de prova
1 - Modernamente nenhuma legislação adoptou o caso julgado como dogma absoluto face à injustiça patente, nem a revisão incondicional da toda a sentença frente ao caso julgado, tendo sido acolhida uma solução de compromisso entre o interesse de dotar de firmeza e segurança o acto jurisdicional e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, solução que se revê na consagrada possibilidade limitada de revisão das sentenças penais.
2 - O recurso de revisão inscreve-se também, parcialmente, nas garantias de defesa, no princípio da revisão que resulta da Constituição ao dispor que os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão de sentença e à indemnização pelos danos sofridos (n.º 6 do art. 29.º).
3 - São os seguintes fundamentos do recurso de revisão:
- falsidade dos meios de prova [art. 449.º do CPP, n.º 1, al. a)];
- sentença injusta [art. 449.º, n.º 1, al. b)];
- inconciabilidade de decisões: inconciabilidade entre os factos que fundamentam a condenação e os dados como provados em outra decisão, por forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. c)];
- descoberta de novos factos ou meios de prova que, confrontados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação (art. 449.º, n.º 1, al. d)].
4 – Os factos ou meios de prova referidos na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP devem ser novos no sentido de não terem sido apresentados no processo que conduziu à acusação se bem que não fossem ignorados pelo arguido, aqueles que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação, embora não fossem ignorados pelo arguido na ocasião em que teve lugar o julgamento.
5 – É de negar a revisão se o recorrente não junta o documento que anunciara provar a sua versão dos factos e as testemunhas inquiridas, ao invés de sustentar a sua tese, a infirmam.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 3443/04-5, Relator: Cons. Simas Santos

Crime de incêndio — culpa — debilidade mental — alcoolismo crónico
1 – Ao julgador, enquanto tal, não devem preocupar as questões de política legislativa, em regra levadas em conta na conformação do tipo legal e da imposição da correspondente pena.
2 - Daí para a frente, do tribunal reclama-se apenas que, ao moldar a medida concreta da pena aplicável a cada caso, o faça dentro dos critérios que a lei também lhe aponta, mormente os do artigo 71.º do Código Penal, donde emerge a importante limitação de que a pena não pode, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa.
3 – Padecendo o arguido de debilidade mental moderada e de alcoolismo crónico, não pode a culpa haver-se como muito elevada, pois os oligofrénicos, mesmo os menos graves, têm limitação, embora moderada, das actividades psíquicas superiores.
4 – O alcoolismo crónico implica um enfraquecimento notável da vontade, e o embotamento ético que lhe anda associado, aponta no mesmo sentido da diminuição da culpa.
5 - A circunstância de o arguido em julgamento se haver remetido ao silêncio não pode ser valorada em seu desfavor, na certeza de que o fez no exercício de um direito – art.º 343.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.
6 - Respeitadas as regras de dosimetria da pena do artigo 71.º do Código Penal, como este Supremo Tribunal tem entendido, nos poderes do juiz cabe o recurso á benevolência, e, porventura, também a alguma severidade, sem possibilidade prática de sindicância em via de recurso.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 3029/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Crime de homicídio — tentativa — matéria de facto — insuficiência da matéria de facto para a decisão
Enferma do vício de insuficiência para a decisão condenatória pelo crime de homicídio voluntário tentado – art.º 410.º n.º 2, a), do CPP – a matéria de facto que, reportando-se aos ferimentos causados na vítima pelo acto do arguido apenas consegue dar conta de que «as feridas respectivas determinaram, além de uma cicatriz supra e infraumbilical com 23cm de comprimento, três outras cicatrizes, paralelas entre si, distando 1,5cm, medindo a maior 1,5 e a menor 1cm, a nível da região infra-axilar, cicatriz a nível do flanco direito, oblíqua, medindo 2,5 x 0,4 cm, cicatriz a nível do flanco esquerdo horizontal medindo 1,5cm e complexo cicatricial medindo 3cm x 4cm a nível da região inframamária esquerda, 173 dias de doença, 42 dos quais com incapacidade para o trabalho», pois fica sem se saber se as lesões eram ou não aptas, em abstracto, a causar a morte.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 3246/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Crime de roubo — reincidência — pressupostos da reicidência
1 - O fundamento da punição da reincidência assenta no desrespeito ou desatenção do agente pela advertência constante de anterior ou anteriores condenações, e, daí, o fundamento para uma maior censura e para uma culpa agravada relativa ao facto.
2 – Esta agravante modificativa não é de funcionamento automático ou de concepção puramente fáctica.
3 - Se é certo que o critério essencial da censura ao agente por não ter atendido a admonição contra o crime resultante da condenação ou condenações anteriores não implica um regresso à ideia de que verdadeira reincidência é só a homótropa, exige de todo o modo, atentas as circunstâncias do caso, uma íntima conexão entre os crimes reiterados, que deva considerar-se relevante do ponto de vista daquela censura e da consequente culpa. Uma tal conexão poderá, em princípio, afirmar-se relativamente aos factos de natureza análoga segundo os bens jurídicos violados, os motivos, a espécie e a forma de execução”, mas pode ir além deles.
4 - Daqui se conclui que não é inteiramente pertinente a pretensão do recorrente quando defende que a reincidência é só a homótropa, isto é a que pressupõe a repetição do mesmo tipo de crime, embora a reiteração de actos de natureza análoga possa constituir um índice, que, todavia, não é exclusivo, de verificação da figura jurídica em causa.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 3258/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Habeas corpus— extradição — princípio da especialidade — evasão do extraditado — princípio da reciprocidade
1 - O que o princípio da especialidade – consagrado no n.º 1 do artigo 16.º da Lei n.º 144/99, de 31/8 – impede é que a pessoa detida sofra prisão ou outra restrição de liberdade «por facto anterior à sua presença em território nacional, diferente do que origina o pedido de cooperação formulado pela autoridade portuguesa».
2 – A circunstância de o arguido se haver evadido e ter sido posteriormente recapturado, em nada altera estes pressupostos, não havendo necessidade de novo pedido de extradição, tendo em conta que, em caso evasão do extraditado, «antes de extinto o procedimento penal ou de cumprida a pena, será de novo detido e entregue ao mesmo Estado ou entidade, mediante mandado de detenção emanado da autoridade estrangeira competente, salvo no caso de ter havido violação das condições em que a extradição foi concedida» - art.º 42.º da mesma Lei – pois tal princípio tinha no caso plena aplicação por força da observância da necessária reciprocidade de procedimentos expressamente consagrada no artigo 4.º n.º 1 do mesmo diploma.
Ac. de 7.10.04 do STJ, proc. n.º 3566/04-5, Relator: Cons. Pereira Madeira

Pena de prisão — Pena de multa — Pena efectiva — Pena suspensa — Alcoolismo
1 – Estando provado que “a arguida não desempenha qualquer actividade, dependendo economicamente da sua mãe e ofendida nestes autos que providencia pela sua alimentação, vestuário, tratamentos, etc.”, a pena de multa não realiza as finalidades da punição, pois pretendendo-se que a pena tenha, entre outros fins, um sentido ressocializador e pedagógico, há-de a mesma constituir um sacrifício para o próprio condenado, de tal monta que o motive a abandonar a prática do crime.
2- Quanto às necessidades de uma pena efectiva de prisão e de não aplicação de uma pena de substituição, o tribunal recorrido justificou-as, ainda que sumariamente, com o facto da arguida “não conseguir libertar-se do consumo excessivo de bebidas alcoólicas, o que faz recear a continuação da actividade criminosa” e, por isso, “impõem-se...algum rigor punitivo, por razões de prevenção especial”. Motivo pelo qual aplicou à arguida a pena única de 1 ano de prisão efectiva, pela prática de 3 crimes de ofensas à integridade física qualificada (6 meses de prisão por cada um), de dano (2 meses de prisão) e de ameaças (45 dias de prisão).
3- O alcoolismo tem semelhanças manifestas com a dependência do consumo de estupefacientes e, como sabemos, quanto a este, o legislador aconselha vivamente o tratamento consentido como forma de evitar a punição (cfr. art.ºs 11.º a 14.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro).
4- Devemos, antes de mais, olhar para esta arguida e ora recorrente como uma doente e, sendo ela primária e tendo cometido os crimes “por motivos de ciúmes do relacionamento da sua filha com a mãe”, tanto mais que a guarda sobre essa sua filha foi-lhe retirada, deverá ser ajudada na sua doença e, portanto, nesta primeira intervenção de um tribunal criminal, há que procurar meios médicos para resolver o problema, sem reclusão prisional.
5- Há, pois, que formular um juízo de prognose favorável e correr um risco prudente, baseado na ameaça que vai constituir para a arguida a execução de uma pena de prisão que já está fixada em um ano de prisão, pelo que é de suspender a pena na sua execução por dois anos, mediante a sujeição da arguida a um plano individual de readaptação social a fixar na 1ª instância, mas que, desejavelmente, deve passar por acompanhamento médico adequado (art.ºs 50.º a 54.º do CP), este após consentimento (art.º 52.º, n.º 2, do CP).
Ac. de 07.10.04 do STJ, proc. n.º 2790/04-5, Relator: Cons. Santos Carvalho

Tráfico de estupefacientes — Grande número de pessoas — Avultada compensação económica — Reformatio in pejus
1 - A lei não considera como agravante a intenção de distribuir as substâncias ou preparações por grande número de pessoas, mas a sua efectiva distribuição a grande número de pessoas.
2 - Ao se indicar que há agravação do tráfico para aquele que “procurava obter avultada compensação remuneratória”, está exactamente a pensar-se nos casos em que, mesmo que não se apure qual a efectiva remuneração do traficante, seja fácil de concluir, pela qualidade da droga, pela sua quantidade e pela posição que o agente ocupa no “negócio” (não sendo mero «correio» ou «vendedor de rua»), que o mesmo iria obter uma larguíssima vantagem económica caso concluísse a «transacção». Outra solução que não esta seria aberrante e contrariaria o senso comum.
3 - Tendo um dos arguidos detido 99,240 g de heroína que vendeu a outrem, cometeu um crime de tráfico de estupefacientes como autor, e não como cúmplice como erradamente decidiram as instâncias, ainda que o tenha feito por conta, sob a ordem e em proveito de co-arguido, ou mesmo só para auxílio deste.
4 - Mas, atenta a proibição de reformatio in pejus, tendo o recurso sido interposto pelo arguido, não pode alterar-se a decisão quanto à qualificação (tanto mais que não lhe foi dada possibilidade de se defender desta alteração) nem retirar-se qualquer consequência mais gravosa para o mesmo (cfr. art.º 409.º do CPP).
Ac. de 07.10.04 do STJ, proc. n.º 2828/04-5, Relator: Cons. Santos Carvalho