terça-feira, 4 de setembro de 2012

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Programa de Formação Avançada Justiça XXI.

Dias 11, 12 e 13 de outubro de 2012, em Faro, na Universidade do Algarve
3ª edição do Curso de Formação “Insolvência de empresas e de pessoas singulares”.
Os associados do SMMP beneficiam de um desconto de 30% sobre a inscrição para o curso (126 euros), nos termos do protocolo firmado.

O sucesso da reforma da justiça e o valor político da verdade

Por António Cluny, publicado em 4 Set 2012  

Todos sabemos como é importante especializar áreas da justiça. Não basta para tanto, porém, dar um nome a uma jurisdição e reservar para ela uma competência específica
1. Um dos piores exercícios da política actual reside na apropriação de conceitos, que indiciam progresso e mais justiça, para justificar e desenvolver depois medidas de sentido contrário.
Certos conceitos, que parecem pressupor mais rigor e alterações generosas do ponto de vista político e social, são frequentemente usados para escamotear o sentido real de medidas visando apenas perpetuar situações que a invocação daqueles sugeriria, em princípio, deverem ser contrariadas.
Por exemplo:
“Reformas estruturais” significa hoje – quase sempre e apenas – contrariar verdadeiras reformas que instituíram direitos sociais para os mais débeis.
“Proceder a ajustamentos” indica, na verdade, mais um corte nas prestações sociais dos que mais delas necessitam.
“Acabar com o regabofe” não se dirige, de facto, à contenção dos ganhos excessivos dos que ocasionaram a “crise”, mas tão-só a rapar ainda mais os magros proventos dos que mais sofrem com ela.
Muito do descrédito da política – e a rápida quebra de confiança em alguns políticos – reside precisamente aí: na evidência da desconformidade do discurso com a prática que depois se tem e que, afinal, sempre se quis ter.
2. Vêm estas considerações a propósito das reformas que têm de ocorrer na justiça.
Dadas a sua especificidade e importância institucionais, importa não deixar contaminar a sua preparação, discussão e posterior concretização com tal tipo de truques e mistificações.
Vejamos algumas clarificações necessárias:
Todos sabemos como é importante especializar áreas da justiça. Não basta para tanto, porém, dar um nome a uma jurisdição e reservar para ela uma competência específica. É necessário, para que se possa falar de verdadeira especialização, que os seus magistrados tenham tido antes uma formação específica sobre as matérias das jurisdições especializadas e possam (devam) beneficiar, depois, de uma actualização regular sobre elas.
A sua escolha tem, pois, de obedecer a critérios predefinidos sobre a formação ajustada ao cargo, o que implicará uma redefinição nos critérios de gestão e no perfil da própria carreira.
Todos sabemos que é necessário criar mecanismos ágeis que propiciem um julgamento útil (em tempo) da pequena e média criminalidade. Sabemos também, contudo, que para tal não basta uma reforma processual. É necessária, além disso, uma orgânica judiciária compatível e, muitas vezes, vocacionada exclusivamente para essa nova forma do processo.
Todos sabemos que é necessário racionalizar os gastos – isso não é crime –, mas importa igualmente saber se as reformas visam, em concreto, apenas o corte da despesa ou se, pelo contrário, esse é apenas um efeito alcançado através de uma mais criteriosa e eficaz gestão de meios.
3. Tornar transparente a motivação concreta das reformas tem de ser o sinal distintivo de uma política singular, pois que dirigida ao cerne da democracia (enquanto Estado de direito) e, portanto, à identificação da comunidade nacional com as instituições que hão-de assegurar o pacto constitucional, garante da soberania.
Há e continuará a haver Portugal depois da troika.
O sucesso da reforma da justiça implica, por isso, que se ignorem os slogans dos “tudólogos” de serviço, que se congregue o saber e a vontade esclarecida dos que nela trabalham ou verdadeiramente estudaram os seus problemas e, acima de tudo, que se queira e saiba falar verdade sobre os objectivos e motivações das medidas que se querem concretizar.
Jurista e presidente da MEDEL

Pinto Monteiro lamenta "feroz oposição interna e externa"


por Lusa, texto publicado por Sofia Fonseca
Fotografia © Vítor Rios/Global Imagens
Pinto Monteiro afirmou hoje "estar orgulhoso" daquilo que fez como procurador-geral da República (PGR), mas disse ter "pena daquilo que queria fazer e não fez", em parte por culpa sua, mas também por "feroz oposição interna e externa".
Falando na cerimónia de tomada de posse, em Lisboa, dos novos procuradores-gerais adjuntos, Pinto Monteiro, que termina o mandato em outubro próximo, revelou "não estar arrependido" de ter aceitado o cargo, apesar de, na altura, ter "hesitado bastante", porque "estava bem" como juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, após subir todos os degraus da magistratura judicial.
"Hoje, hesitaria menos e aceitaria logo", acentuou.
Justificando o tom confessional da sua intervenção de hoje, por ser a última cerimónia de posse em que participa como PGR, Pinto Monteiro disse ter "orgulho" naquilo que fez enquanto titular do cargo e, quanto "àquilo que queria fazer e não fez", assumiu a sua quota parte de culpa, atribuindo a restante à "feroz oposição interna e externa" que teve durante o seu mandato.
A este propósito, insistiu que "era altura de rever os Estatutos" do Ministério Público (MP), por forma a atualizá-los, observando que, nesse domínio, o "Estado devia clarificar várias situações e definir a chamada relação de forças dentro do MP".
Caso contrário, anteviu que o MP sentirá dificuldades em cumprir as suas obrigações perante os cidadãos, apesar de ter magistrados de "alto gabarito".
Diário de Noticias 4-0-2012

Afinal a corrupção não existe?

José Vítor Malheiros

Público (terça-feira, 04 Setembro 2012)
“Digo-vos olhos nos olhos: o nosso país não é um país corrupto, os nossos políticos não são políticos corruptos, os nossos dirigentes não são dirigentes corruptos. Portugal não é um país corrupto.” As palavras são da procuradora-geral adjunta e directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Cândida Almeida, durante a Universidade de Verão do PSD. A magistrada não se ficou porém por aqui e sublinhou em diversos matizes a ideia de que, em Portugal, “a corrupção é residual”, apesar de haver uma “percepção” de uma elevada incidência de corrupção, devido ao sensacionalismo da comunicação social, a figuras públicas que falam de corrupção com base em rumores sem fundamento e a relatórios como os da organização Transparência Internacional que, mais uma vez, se referem a percepções dos cidadãos e não a casos provados de corrupção.
Se há pessoa em Portugal que deve perceber de corrupção é Cândida Almeida.
Se há pessoa cuja profissão lhe permite estar informada de todos os pormenores de todos os casos reais ou suspeitados de corrupção é esta. E, por tudo o que sabemos de Cândida Almeida, não temos nenhuma razão para imaginar que tenha razões ocultas para nos mentir. E no entanto… não conseguimos acreditar numa palavra do que nos diz. Percepções. Mais: a própria Cândida Almeida sabe que aquilo que nos diz não é credível.
Como é que se vê isso? São aqueles recursos retóricos, os “olhos nos olhos”, a repetição enfática das palavras. Além de que a própria procuradora confessa mais à frente que veria com bons olhos alterações legislativas de modo que o Ministério Público pudesse comparar as declarações de património entregues no Tribunal Constitucional pelos detentores de cargos políticos com “o património que estes efectivamente detêm”. Para quê, se “os nossos políticos não são corruptos”? Mas a procuradora fez mais e especificou que, muitas vezes, quando se fala de corrupção dos poderosos, se está a falar de facto de fraude fiscal, que é algo completamente diferente. E deu um exemplo: muita gente pensa que a Operação Furação se refere a corrupção, quando aquilo que investiga é, na realidade, um caso de fraude fiscal. Não tem nada a ver!
E aqui as coisas clarificam-se: Cândida Almeida, jurista e magistrada, está de facto a referir-se a uma definição jurídica de corrupção, precisa e específica, estreita e formal, daquelas que vêm nos códigos penais, e não à corrupção como a entendemos na linguagem de todos os dias, em português, nas conversas, nas discussões, na actividade política. Cândida Almeida fala de uma corrupção (o itálico aqui quer dizer, como teria dito Eduardo Prado Coelho, “uma corrupção outra”, que não é “a corrupção”) que eu não faço a mínima ideia do que seja nem estou particularmente interessado em saber porque não tem o sentido prático e ético que nos interessa a nós, cidadãos, quando a usamos no debate político. A acepção judiciária em que Cândida Almeida usa a palavra servirá para ver, no catálogo das penas, qual se deve aplicar quando se prova em tribunal que alguém abusou de um cargo público, se abotoou com bens públicos ou desviou bens públicos para benefício próprio, do primo, do partido ou do banco que lhe vai dar emprego quando sair do Governo. Mas não é a acepção comum, que define corrupção de forma mais ampla, como desonestidade, como falta de integridade, como imoralidade, como roubo, como desvio e não apenas como um acto mas como uma cultura. A corrupção que eu e muitos outros sentimos (sim, uma percepção) no “arco do poder” em certos casos nem sequer é ilegal. É o caso dos deputados que são ao mesmo tempo advogados e consultores dos mais variados interesses, que foram eleitos pelo povo para defender a causa pública e que estão no Parlamento para defender interesses privados. Legal. Mas corrupção.
É a corrupção da democracia. É o caso dos políticos que no Governo fazem favores às empresas que depois os compensam da sua lealdade contratando-os quando saem do Governo. Legal. Mas corrupção. Ou melhor: percepção de corrupção. É o caso das obras inúteis ou dos empréstimos contraídos a juros agiotas para benefício de construtoras e bancos em prejuízo do erário público. É o caso da venda a preço de saldo de empresas públicas para benefício das empresas compradoras. É difícil de provar que haja intenção de obter benefício próprio e dos amigos? Pode tratar-se de uma opção ideológica? Pode.
Há de facto uma opção ideológica que consiste em roubar o Estado, distribuir as riquezas roubadas pelos amigos mais ricos e tentar reduzir os mais pobres à inanição e à passividade. Mas o verdadeiro nome disto é corrupção.
Ainda que o PSD, o CDS e uma parte do PS nos andem a tentar convencer que isso se chama política. Não chama. A política é a generosidade da polis, da coisa pública. Esta gestão de fortunas que o Governo faz chama-se (desculpe, Cândida Almeida) corrupção. E existe. Escreve à terça-feira