terça-feira, 6 de agosto de 2013

A propósito da anunciada extinção da Polícia Judiciária Militar

A propósito da anunciada extinção da Polícia Judiciária Militar


BARTOLOMEU DA COSTA CABRAL

A Polícia Judiciária Militar (PJM), ao contrário de outras polícias e órgãos de polícia criminal (OPC), não possui grande visibilidade externa nem tem grande proximidade com os órgãos de comunicação social, o que em certa medida se explica pelo facto de a sua actividade se exercer no interior do mundo castrense, por imperativo da sua missão se materializar na investigação dos crimes estritamente militares e de outros que sejam perpetrados no interior de instalações militares.

Ao contrário de outras polícias, a PJM conta com um reduzido número de efectivos (cerca de uma centena) e apenas duas delegações, Lisboa e Porto. Os seus quadros militares pertencem aos ramos das Forças Armadas, onde para todos os efeitos são contabilizados.

Esta introdução vem a propósito da necessidade de desmistificar as justificações para a anunciada extinção deste órgão de polícia criminal militar. Quer se pretenda encontrar uma justificação de âmbito económico quer se evoque uma racionalização de meios convém relembrar que os custos com esta polícia são completamente residuais, atendendo à sua pequena dimensão e ao facto de o seu pessoal pertencer às Forças Armadas, que continuarão a ser responsáveis pelo pagamento dos respectivos vencimentos.

Um outro argumento apresentado para atribuição das suas competências à Polícia Judiciária (PJ) civil prende-se com a construção da nova sede desta polícia que, ao que parece, terá sido sobredimensionada e agora é necessário justificar através do preenchimento dos espaços sobrantes.

Fracos argumentos estes que, sem qualquer fundamento substantivo, extinguem um órgão de polícia criminal especial e único, sem cuidar de perceber a justificação pela qual historicamente a investigação dos crimes militares sempre coube a investigadores subordinados ao estatuto da condição militar, podendo recair sobre militares das FFAA ou da GNR, embora na dependência funcional do Ministério Público (MP).

Certamente a natureza dos crimes e dos bens jurídicos tutelados levou os decisores a optarem pela atribuição da responsabilidade da investigação a um órgão especialmente vocacionado para lidar com os interesses jurídicos em causa, num ambiente muito específico. A existência de juizes militares nos tribunais que julgam os crimes de natureza militar e de assessores militares junto dos magistrados do MP na fase de inquérito são bem reveladores da preocupação e da necessidade sentida pelo legislador em conferir singularidade à realidade castrense.

Os próprios crimes do foro comum cometidos no interior de instalações militares têm uma possibilidade de dano que extravasa o núcleo do bem jurídico que tutelam porque, em razão do lugar onde são cometidos, estão associados com a vivência militar, afectando valores de confiança e de disciplina interna das Forças Armadas e da GNR.

A sua investigação por outro OPC que não o militar colidirá com questões operacionais e de segurança e será prejudicial à coesão da Instituição Militar.

Caso a extinção da PJM venha a ocorrer, tanto as Forças Armadas como a Guarda Nacional Republicana passarão a assistir à intervenção de uma polícia civil no interior dos seus quartéis, sem qualquer constrangimento ou limitação. Ao mesmo tempo, sempre que um crime estritamente militar ocorrer num teatro de operações no exterior passaremos a ver uma equipa de investigadores civis deslocar-se à "frente de batalha" para fazer as suas investigações.

Mas mais! De acordo com a lei, em tempo de guerra, para cada processo a decorrer nos tribunais militares extraordinários, que podem ser criados no teatro de operações (TO), é nomeado um oficial mais graduado ou mais antigo do que o arguido para desempenhar as funções de Ministério Público.

Ora, imagine-se a previsível situação num desses tribunais, com as funções de MP a serem exercidas por um oficial, tendo como agentes funcionalmente subordinados elementos civis da PJ, que não estão sujeitos à condição militar, mas que terão de proceder à investigação num TO de grande conflitualidade. Provavelmente não será a opção mais aconselhável.

No passado dia 10 de Junho, o senhor Presidente da República, comandante supremo das Forças Armadas, referiu que as reformas nas FFAA devem salvaguardar a sua razão de ser, não pondo em causa a sua capacidade de combate, motivação e a sua condição militar.

Compete a quem de direito efectuar as reformas entendidas por necessárias. Contudo, os portugueses esperam que estas opções sejam sensatas e não descaracterizadoras das instituições.

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