domingo, 11 de agosto de 2013

Tiques Eugénicos

Fernanda Palma | Correio da Manhã | 11-08-2013
Investigadores portugueses e alemães publicaram um estudo em que se sustenta que nós ficámos para trás em termos de estatura, no contexto da Europa, desde o século XIX, devido à lenta evolução dos salários reais e à falta de investimento na educação. Esse estudo pretende contribuir para responder à seguinte pergunta: "Por que é Portugal um país atrasado?"
Numa interpretação benigna, um estudo desta natureza pode servir para criticar políticas sociais miserabilistas e injustas, denunciando a relação óbvia entre salários baixos e subdesenvolvimento. Todavia, não nos podemos esquecer de que é possível um aproveitamento que associe a estatura das pessoas à sua "pureza rácica" ou à sua capacidade física e mental.
Esta perspetiva remete-nos para a "eugenia" (em grego, "bem-nascido"), com que o antropólogo inglês Francis Galton, primo de Charles Darwin, designou o estudo dos fatores que podem melhorar as "qualidades raciais" das gerações futuras. Instrumentalmente, a "frenologia" pretende determinar o caráter e a perigosidade das pessoas pela forma da cabeça.
Foram norte-americanas as primeiras leis eugénicas, que prescreveram esterilizações compulsivas e proibiram casamentos inter-raciais (em alguns Estados, até 1967). No entanto, foi o nazismo que consagrou as medidas mais odiosas, como o "programa de eutanásia", orientado para a execução de doentes crónicos e "indesejáveis" sociais, que culminou no holocausto.
A Ciência não faz depender os seus estudos de critérios políticos. Não deve ser preconceituosa e tem de fazer perguntas politicamente incorretas e incómodas no plano ético. Porém, os cientistas selecionam problemas que carecem de solução numa perspetiva humana. E o tema da altura dos povos (tal como a cor da pele, dos olhos ou do cabelo) não é inócuo.
Na verdade, a altura dos povos não é um índice da sua saúde, da sua inteligência ou do seu progresso e a dignidade das pessoas não advém da sua estatura. O pressuposto de que existe uma correlação entre a altura e o desenvolvimento dos povos envolve uma petição de princípio. E o empirismo não constitui um método adequado para fundamentar essa teoria.
Saber se os hábitos alimentares ou as condições de higiene têm implicações na saúde ou na esperança de vida é importante, até para fundamentar as políticas sociais. Mas devemos rejeitar quaisquer análises que sugiram a seleção de seres humanos com base em dados antropométricos, respeitem eles à altura ou à cor da pele, dos olhos ou do cabelo.

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