quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Sindicalismo é sinónimo de solidariedade


A afirmação é de Fernando Jorge Fernandes, presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais, e, para além de espelhar a essência da atividade sindical, ilustra a reminiscência de um ilustre político polaco e ativista dos Direitos Humanos, Lech Walesa, que terá despertado a consciência social neste domínio.
Partidário da ideologia sindical, Fernando Jorge dá voz aos funcionários judiciais portugueses que se vêem quartados dos seus direitos. Unida em jornadas de luta, a classe, em uníssono, continua a pelejar pela observância dos Direitos, Liberdades e Garantias perante um cenário político-económico adverso. Em entrevista ao 'Qualidade&Inovação', o presidente comenta alguns dos paradigmas que marcam a atualidade jurídica.
Mais do que um marco histórico, o 25 de abril é o corolário de conquistas geracionais. Uma revolução de esperança que fez renascer os anseios que os portugueses traziam no âmago - que se materializam na constituição de um Estado de Direito Democrático.
Assim, por entre as vitórias dos patriotas que fizeram de «Grândola Vila Morena» um hino à resiliência, destaca-se a elaboração da Constituição da República Portuguesa, onde se prevê, por exemplo, a Liberdade Sindical (art.- 57). E é neste breve retrato histórico que se enquadra a génese de muitos movimentos sindicalistas, entre eles o Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ). É em 1975, quando ainda "era proibido o sindicalismo na Função Pública" comorecorda Fernando Jorge, presidente do
SFJ -, que reside "a origem deste Sindicato". Na altura, "havia necessidade de criar este movimento sindical, tendo, então, sido repartido por quatro zonas, nomeadamente. Norte, Centro, Lisboa (onde se inclui Açores e Madeira) e Évora". Na verdade, o cenário assim se manteve até 1987, estando as quatro organizações sob a égide da Comissão Executiva Nacional. É então que, no seio dos sindicalistas, surge uma ideia visionária: "Agregar as quatro unidades num sindicato nacional único, naturalmente com as respetivas delegações". Com efeito, surge oficialmente o Sindicato dos Funcionários Judicias, com uma matriz identitária assente "na defesa dos interesses e direitos dos trabalhadores", recorda o entrevistado. A apenas dois anos de comemorar uma data emblemática - 40 anos -, Fernando Jorge aproveita o ensejo para tecer uma retrospetiva daquilo que tem sido a ação sindical do SFJ. Assim, para além da ação reivindicativa, a Instituição encara a vertente lúdica e recreativa como um fator de coesão social, promovendo, para tal, "convívios nacionais, atividades desportivas, e, inclusive, uma festa de Natal em todas as delegações". Simultaneamente, a atuação do Sindicato dos Funcionários Judiciais encontra-se alicerçada em três domínios: Formação, Apoio Jurídico e Ação Médica.
"São os três fatores-chave", atesta. No âmbito da formação, e de forma a apostar na qualificação dos seus associados, o SFJ organiza, com frequência, iniciativas que visam esclarecer/aprofundar conhecimentos sobre variadíssimas temáticas, como o Regulamento sobre as Custas Processuais - sobre o qual o Sindicato publicou, inclusive, "um livro já com duas edições", esclarece o presidente. Para tal, "dispomos de um grupo de pessoas de reconhecida capacidade e competência da área formativa, todos eles ex-dirigentes do Centro de Formação de Funcionários Judiciais. Estes estão encarregues de coordenar o nosso departamento e planear e promover ações por todo o país e todos os tribunais. Recebemos inúmeras solicitações dos associados e só não fazemos mais porque não podemos".
A corroborar a ênfase nesta vertente está o facto de, no ano passado, ter sido gasta uma verba de 45 mil euros em ações de formação. Sendo a Saúde um vetor de crucial importância em qualquer sociedade, e estando o seu acesso cada vez mais limitado por fatores de ordem económica - como o aumento das taxas moderadoras -, o SFJ estabeleceu um protocolo que apresenta mais-valias inegáveis para os associados. Inicialmente, "tínhamos os serviços sociais do Ministério da Justiça que, entretanto, foram extintos. Para suprir esse deficit criámos um departamento de assistência médica, através do qual os nossos associados têm acesso a consultas a preços acessíveis - estendendo-se os benefícios até ao segundo grau de parentesco.
Paralelamente, e ainda neste domínio, "disponibilizamos a vertente de crédito para serviço clínico", de forma a acautelar as situações urgentes. Neste sentido, "o Sindicato assume a responsabilidade junto dos hospitais com quem temos convenção e, a posteriori, negociamos com a pessoa a forma de pagamento mensal sem qualquer tipo de juros. O protocolo é de tal forma interessante que foi estendido ao Sindicato do Ministério Público, Associação Sindical dos Juizes Portugueses, Associação Sindical da Polícia Judiciária e, agora, ao Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos". Finalmente, no que ao apoio jurídico concerne, e denotando o eminente crescimento das necessidades de proteção jurídica, a Instituição dispõe de "um advogado, em cada uma das suas delegações de Lisboa, Porto e Coimbra. Hoje, mais que nunca, é preciso acautelar estas situações porque o número de sonegação de direitos e de processos disciplinares tem aumentado". Tudo isto está ao alcance de qualquer funcionário judicial sindicalizado pelo pagamento de uma quota de 0,75%. Habitualmente, "aquilo que se assiste no âmbito sindical, genericamente, é de 1%, havendo, no entanto, sindicatos que cobram estas vertentes à parte. Aqui, no Sindicato dos Funcionários Judiciais, está tudo incluído", garante.
Retrato de um país em «reforma» A reforma da Justiça é um dos temas que tem marcado a agenda política dos sucessivos governos, nos últimos anos. Porém, as sentenças que se protelam no tempo fazem pairar um sentimento de impunidade nos autores dos crimes, e de "injustiça para as vítimas". Assim, Fernando Jorge, perfeito conhecedor do quotidiano dos tribunais, faz o diagnóstico: "O problema da Justiça, na ótica do cidadão, reside na falta de celeridade que culmina, obviamente, na descredibilização". Para contornar esta situação torna-se imperioso "investir na Justiça e alterar a legislação". Por entre as medidas mais mediatizadas no contexto de reforma judicial destaca-se, por exemplo, a do Código de Processo Civil. Apesar de considerar que, efetivamente, "se poderia ter ido mais longe", Fernando Jorge é perentório ao afirmar que "as medidas previstas podem, de facto, tomar o processo civil mais célere. É, a meu ver, uma boa medida".
Apesar "do debate sobre a Justiça já ter sido mais intenso, nunca houve na calha reformas como as que se tem vindo a assistir. É uma completa revolução", advoga. Neste sentido, impõe-se, igualmente, o debate sobre a reforma do Mapa Judiciário - um tema que tem divergido a opinião de figuras proeminentes. Questionado felativamente ao facto dos interesses da sociedade estarem salvaguardados nesta reforma, Fernando Jorge é categórico: "Não. Esse interesse não será acautelado porque a Justiça vai ficar mais longe em todos os aspetos. Apesar dos meios informáticos estarem mais desenvolvidos, estamos a afastar a Justiça dos cidadãos", contrariando, assim, os princípios constitucionalmente previstos. "A Justiça tornar-se-á mais fechada, sobretudo numa altura em que a situação de crise socioeconómica impõe a necessidade das pessoas recorrerem aos tribunais para lutar pela defesa dos seus direitos.
A reforma do mapa judiciário vai afastar ainda mais as pessoas dos tribunais do trabalho, de família e, ao aumentar o sentimento de impunidade, poderá criar situações em que se opte por fazer justiça com as próprias mãos, o que seria um cenário muito problemático". Neste tipo de reformas, temse olhado pelo prisma "económico, esquecendo-se as questões sociais. Do meu ponto de vista, os grandes problemas são os sociais e não os económicos". Embora reconhecendo a importância de uma estrutura económica coesa para o crescimento de qualquer sociedade, o presidente do SFJ defende que "é preponderante que a Justiça funcione bem, mas o que se tem assistido nos últimos anos é a um desinvestimento, não só ao nível de investimentos diretos, mas também de meios, equipamentos e, sobretudo, nos profissionais. É notório o desinvestimento nas pessoas e na sua qualidade. Neste debate de Justiça versus Economia não se pode desinvestir nos setores que são fundamentais para a sociedade".
Prevendo este cenário de difícil acesso à Justiça, há um aspeto que inquieta Fernando Jorge: a demissão, em bloco, da equipa do Habilus - plataforma informática. "O Habilus era gerido por uma equipa de oficias de justiça que se demitiu recentemente. Porém, o programa que o Ministério está a planear usar ainda não está em condições de ser implementado. Sem uma plataforma eficaz que assegure transferência eletrónica de processos, não é possível implementar uma reforma judiciária eficaz".
 De salientar que "a equipa do Habilus teve louvores em Diário da República e o programa chegou, inclusive, a ser levado a fóruns internacionais. A competência e eficácia daquela equipa e a qualidade do programa estão, indubitavelmente, comprovados". Por sua vez, a ação executiva, privatizada há 10 anos, foi, na ótica do entrevistado, "um erro".
Na tentativa de promover a celeridade, optou-se "pela via da desjudicialização, mas o paradigma não mudou. Na atualidade fala-se numa reforma da ação executiva, atribuindo-se novamente ao tribunal o cumprimento de muitas ações executivas. Contudo, não podemos esquecer que, nestes 10 anos, saíram dos tribunais 2 mil funcionários e entraram apenas cerca de 130.
Os tribunais estão, portanto, numa situação de rutura". Aliás, este foi um dos temas que marcou a abertura do ano judicial, sendo que o Presidente da República e a própria ministra da Justiça já se tinham pronunciado concordando com a necessidade de admitir funcionários nos tribunais. "Esta não é uma questão sindical nem de corporativismo. Se está na agenda política é porque é, efetivamente, uma situação gravíssima". Recentemente, o Ministério da Justiça anunciou a admissão de 500 estagiários que irão ingressar nos tribunais. Apesar de, tendencialmente, esta medida poder representar um fator favorável para os tribunais, já que, durante um ano, usufruirão do contributo de 500 profissionais licenciados, na opinião do presidente do SFJ, esta situação consubstancia-se, claramente, "num cenário de trabalho precário. Esta medida já foi adotada por governos anteriores, não é uma inovação. Em anos transatos foram admitidos estágios profissionais nos tribunais porque, efetivamente, está previsto na Lei, não há nenhuma irregularidade no processo". Porém, acontecerá o mesmo que "sucedeu há dois anos: os estagiários - por quem nutro enorme apreço empenham-semuito e têm conhecimentos, mas quando já estão a desempenhar muito bem as funções termina o estágio. Este enquadramento mais não é do que uma situação para remediar a falta de funcionários judiciais. Se nos dessem a garantia de que, findo o estágio, seria aberto um concurso para ingresso na carreira, aí sim, seria interessante porque estas pessoas são precisas e vão, certamente, fazer um excelente trabalho", advoga.
Após este breve retrato do panorama jurídico, Fernando Jorge considera que, de forma geral, Paula Teixeira da Cruz, ministra da Justiça tem "feito um bom trabalho e implementado medidas que são necessárias. Aliás, considero que o trabalho desenvolvido pela equipa que a ministra dirigia, em consonância com o Dr. João Miguel Barros, era extraordinário". Por isto, "preocupa-me o facto do Dr. João Miguel Barros se ter demitido da função de chefe de gabinete. Desconheço os factos que terão incitado tal decisão, mas lamento profundamente a sua demissão. Disponibilidade e competência são adjetivos que bem caracterizavam o trabalho dele. Temo o que acontecerá futuramente do ponto de vista do diálogo com a Tutela - porque ele era o nosso interlocutor - e, sobretudo, no que à concretização das reformas concerne".
"Ataque ao funcionalismo público"
As medidas de austeridade corporizadas no Orçamento de Estado (de 2012 e 2013) têm fustigado severamente a sociedade. Os funcionários públicos não são exceção. Redução nos salários e corte nos subsídios são apenas algumas das duras realidades a que estes profissionais assistem. Perante este pressuposto, o entrevistado defende que se tem verificado "um ataque ao funcionalismo público, ao passo que se regista, simultaneamente, uma desvalorização. A própria sociedade civil já reconheceu que o problema do país não é a Função Pública. Admito que alguns setores necessitem de ser reorganizados, mas é preocupante um cenário onde se prevê um corte de 4 mil milhões de euros como foi anunciado". No fundo, todo este cenário configura um verdadeiro "retrocesso em termos de direitos trabalhistas. Desde que sou funcionário judicial, recordo-me que, todos os anos, havia atualização dos vencimentos. No entanto, chegou a altura em que deixou de se verificar esse aumento. Hoje, em sentido contrário, assiste-se a uma redução.
Público, 27-02-2013

O mito escangalhado


por BAPTISTA-BASTOS
Tudo indica que o Grande Manitu das finanças portuguesas não passa de uma fraude. O homem, tido e havido como um génio sem par, não lhe acerta uma. De cada vez que se põe a prever, a projectar números e concepções, sai tudo errado; pior: acontece o contrário, com a consequência nefasta de afectar milhões de nós. Só agora, as indignações e os vitupérios começaram a surgir. E posta em causa a competência de Vítor Gaspar. Não se lhe exige que seja uma pitonisa de Delfos, dispondo de poderes premonitórios quase divinos. Mas pede-se-lhe, unicamente, que faça bem o seu trabalho: analise, compare, estatua as previsibilidades do mercado. A experiência ideológica aplicada a Portugal, de que ele é um obediente serventuário, conduz a um esvaziamento do próprio animus colectivo, resultado de um empreendimento de sujeição baseado no medo, na violência e na unilateralidade de pensamento.
No domingo, durante o programa Prós e Contras, de Fátima Campos Ferreira, um dos melhores que vimos, o general Loureiro dos Santos referiu que, nas Forças Armadas, um oficial superior que se enganasse tanto e tantas vezes, já tinha sido despedido. Aliás, durante a sessão, as críticas às definições e às decisões do Governo foram das mais lúcidas interpretações que tenho ouvido acerca da maneira e do modo como estamos a ser conduzidos e governados. Todo o poder encontra sempre uma resistência, sobretudo quando actua admitindo não haver possibilidade de escolha e de alternativa. As decisões são aceitas e tomadas em conjunto.
É, pois, preciso não esquecer de que a desgraça que nos atinge estende-se, na sua imperiosa e grave crueldade, à culpa de todos os membros do Executivo. Nenhum é inocente e cada um e todos terão de ser punidos, para lá do que as urnas disserem. A correlação entre acção e indulgência, que se tornou uma absurda normalidade, tem de ser interrompida, e os governantes responsabilizados. Recordo que a França, após a Libertação, criou a figura jurídica de "indignidade nacional" aplicável aos que haviam tripudiado sobre "a honra da pátria e os direitos de cidadania."
O lado "punitivo e ideológico", de que fala a eurodeputada socialista Elisa Ferreira, foi por eles criado e desenvolvido com inclemência e zelo. Resgatar a tragédia aplicando-lhes o mesmo remédio é uma tese que faz caminho, como resposta de justiça, nunca como retaliação ou vingança. Justiça, pura e simplesmente
O que este Governo nos tem feito representa a mais grave contraconduta social, política, cultural e humana verificada em Portugal desde o salazarismo. O discurso oposicionista não pode, somente, ser "diverso" e incidir, apenas, na "actualidade" portuguesa. Os sicários deste projecto encontram-se espalhados transver- salmente por todos os sectores da actividade europeia, mas não há batalhas inúteis, nem lutas sem sofrimento.
Diário de Notícias, 27-02-2103

Procuradora-geral quer Amadeu Guerra no DCIAP


Joana Marques Vidal enviou, esta tarde, nome do magistrado para os elementos do Conselho Superior do Ministério Público. Escolha é votada amanhã
A Procuradora-geral da República (PGR), Joana Marques Vidal, já indicou hoje aos membros do Conselho Superior do Ministério (CSMP) o nome do procurador Amadeu Guerra para sucessor de Cândida Almeida à frente do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP). O nome do magistrado será votado, amanhã, numa reunião do CSMP.
Amadeu Guerra é atualmente procurador-geral adjunto e coordenador dos procuradores do Tribunal Central Administrativo do Sul.
Leia mais sobre o curriculum do magistrado amanhã na edição impressa do DN
Diário de Noticias on line, 27-02-2013

"De" e "da" na lei de limitação de mandatos

Público - 27/02/2013 - 00:00

Revolução Branca usa troca em tribunal
Se os partidos tendem a desvalorizar a troca do "de" pelo "da", já o movimento Revolução Branca assenta, em parte, nesta troca de palavras a sua argumentação jurídica para travar candidaturas de autarcas que já cumpriram três mandatos e que se voltam a candidatar noutro concelho.
A providência cautelar interposta contra o PSD e Luís Menezes por avançar como candidato para o Porto refere que o anteprojecto da lei 46/2005 escrevia "presidente da câmara" e não "presidente de câmara". Se tivesse mantido a redacção inicial "não existiriam dúvidas que o que estava em causa não era o exercício de funções em si, mas sim o exercício das mesmas numa dada câmara". Ou seja, "que o candidato só estaria inibido a um quarto mandato consecutivo na câmara em questão". Como o "da" foi trocado pelo "de", o movimento Revolução Branca conclui que "o legislador quis deliberadamente afastar tal realidade geograficamente limitada a um mero local". A alteração, acrescenta, "foi feita em sede de processo legislativo e como tal resulta clara a vontade do legislador em se expressar desta forma". O Movimento Revolução Branca interpôs sete providências cautelares sobre candidatos anunciados do PSD nesta situação. S.R.

Provedor pede clarificação da lei dos mandatos mas partidos não vão mexer

MARGARIDA GOMES E SOFIA RODRIGUES 

Público - 27/02/2013 - 00:00
Quatro dias depois de Cavaco Silva ter assinalado um erro de publicação na lei, Alfredo José de Sousa dirigiu uma recomendação ao Parlamento para acabar com as dúvidas sobre o controverso diploma
O provedor de Justiça, Alfredo José de Sousa, recomendou ontem ao Parlamento para que de uma forma "urgente" torne clara e transparente a lei de limitação de mandatos, legislando de maneira a clarificar se um presidente de câmara com três mandatos consecutivos pode, ou não, candidatar-se noutro concelho.
Depois de há pouco mais de um mês ter afirmado que só os tribunais poderiam resolver a questão, Alfredo José de Sousa considera agora que a manutenção da discussão - não só mediática, mas também académica - "pode prejudicar a serenidade necessária ao diálogo político sobre os problemas que, a nível local, devam ser resolvidos pelas autarquias locais". E na recomendação enviada ontem à Assembleia da República para que se encerre a discussão (...), o provedor solicita ao Parlamento a "urgente superação do debate existente quanto à interpretação do artigo n.º 1 da Lei 46/2005, de 29 de Agosto de 2005".
Há oito anos, pela primeira vez, PS e PSD chegaram a um acordo político relativamente a esta matéria e avançaram com a lei de limitação da mandatos. Estava-se em Maio de 2005, José Sócrates era primeiro-ministro e Marques Mendes presidia ao PSD. Bastou apenas um dia para que a lei ficasse decidida. Num dia de Maio, a cinco meses das eleições autárquicas, os dois líderes encontraram-se pessoalmente, tendo voltado a falar mais duas vezes, nesse mesmo dia por telefone, antes de recomendarem aos líderes das respectivas bancadas parlamentares que avançassem com o projecto de lei sobre a limitação de mandatos.
Na altura não se colocava a pressão que existe por estes dias, porque as eleições deste ano abrem um novo ciclo político, uma vez que os presidentes com três ou mais mandatos consecutivos não podem recandidatar-se na mesma autarquia. Segundo revelaram ao PÚBLICO fontes dos dois partidos, nem José Sócrates nem Marques Mendes se preocuparam em discutir se a limitação era em relação à função ou ao território, porque, na altura, o importante era criar pela primeira vez uma lei de limitação mandatos que impedisse a eternização no poder dos presidentes de câmara.
A única divisão que existia entre o primeiro-ministro de então e o presidente do PSD tinha apenas a ver, de acordo com as mesmas fontes, com o facto de José Sócrates querer que a lei fosse aplicada nas autárquicas de 2005, enquanto Marques Mendes entendia que não, uma vez que a grande maioria dos candidatos já estava lançada.
Confrontado pelo PÚBLICO com a decisão de Alfredo José de Sousa, o antigo líder do PSD declarou: "Concordo totalmente com a recomendação feita pelo provedor de Justiça. À política o que é da política, à justiça o que é da justiça". Considerou ainda que é um "erro" deixar que sejam os tribunais a resolver esta questão. "Envolver os tribunais neste processo, que é sobretudo de natureza política, conduz à chamada judicialização da política", remata Marques Mendes.
Também Ribeiro e Castro, na altura líder do CDS, afirmou que a lei foi feita efectivamente para travar a "eternização dos presidentes na mesma câmara". "Era presidente do CDS e não tenho dúvida nenhuma que o sentido da lei é impedir que os presidentes de câmara se eternizem à frente da mesma câmara. Foi isso que se discutiu", garante o agora deputado do CDS, afirmando que a questão do presidente "da" câmara e do presidente "de" câmara em "nada resolve a polémica".
Apesar da recomendação de Alfredo José de Sousa nenhuma das bancadas parlamentares vai avançar com qualquer iniciativa para corrigir a lei de limitação dos mandatos autárquicos, que, por erro, escreve "Presidente de Câmara" em vez de "Presidente da Câmara".
Partidos não reagem
O erro da troca de um "da" por um "de" reforça a interpretação de que os candidatos não estão impedidos de se candidatarem a presidente de câmara noutro concelho, mas nem o PSD, que defende esta posição, vai avançar com qualquer correcção. A alteração à lei implicaria um novo processo legislativo, já que não é possível rectificar uma lei mais de seis anos após a sua publicação.
As bancadas do PSD e do CDS não vão mexer em nada, mas estão disponíveis, no entanto, para apreciar qualquer iniciativa nesse sentido, embora tal como o PS, o PCP e o BE não pretendam avançar para a correcção do erro detectado agora pelos serviços da Presidência da República.
A argumentação dos sociais-democratas para defender uma nova candidatura de autarcas que já cumpriram três mandatos assenta nos princípios constitucionais de direitos, liberdades e garantias. Por isso, desvalorizam a importância deste erro. O CDS, por seu turno, quer manter ainda mais distância desta polémica, uma vez que nunca foi protagonista na elaboração desta lei e mostrou ter divergências internas sobre a interpretação que acabou por vingar, próxima da posição do PSD.
O PS quer também manter a discrição nesta matéria. Embora concorde com a posição do PSD, o PS decidiu não colocá-la em prática e, por isso, não vai apoiar candidatos que já tenham cumprido três mandatos consecutivos noutro concelho.
Ontem, a Associação Transparência e Integridade, que na semana passada entregou nos tribunais administrativos de Lisboa e do Porto requerimentos contra as candidaturas de Fernando Seara e Luís Filipe Menezes por serem "candidatos em limite de mandatos consecutivos", lançou uma acção intitulada Semana da Limitação de Mandatos, durante a qual será divulgada informação útil sobre o tema na Internet.